TRANSITORIEDADES
“Tem gente que vem e que voltar, tem gente que vai e quer ficar, tem gente que veio só olhar, tem gente a sorrir e a chorar. E é assim chegar e partir são só dois lados da mesma viagem” (Encontros e Despedidas. Milton Nascimento e Fernando Brant).
Aqui estou eu novamente. Eu não sou muito adepto da matemática, mas realmente preciso arriscar-me em um cálculo. Julgando que viajo semanalmente entre Itaipava e Cabo Frio, transitando por conta disto duas vezes por semana pela rodoviária novo rio. Julgando ainda que um mês tem quatro semanas, logo, transito pela rodoviária oito vezes no mês, caso o ano tivesse dez meses eu teria passado pela rodoviária oitenta vezes no ano. Se acham que contabilizei dez meses só pra facilitar a conta, estão enganados, eu levei em consideração as férias e algumas vezes que vou de carro.
Oitenta vezes no ano! Por que a exclamação? Porque nos últimos sete anos eu faço esta rotina, ora multiplicando oitenta por sete, segundo minha calculadora dá 560, isto mesmo, deixarei em algarismos numéricos para destacar, 560 vezes eu já passei por esta rodoviária! Será que devo requisitar um recorde? Quantas pessoas já transitaram por uma rodoviária tantas vezes? Acredito realmente que tirando o pessoal que trabalha por aqui, ninguém passou mais vezes neste lugar que eu.
A rodoviária me ensinou muitas coisas, no entanto, entre elas, eu entendi que a vida é transitória. A transitoriedade não necessariamente está vinculada a instabilidade, não. Por transitório, compreendo a dinâmica da vida, as mudanças, os acontecimentos e as descontinuidades. A vida é transitória, isto quer dizer que estamos em trânsito o tempo todo, nada é estático, estamos sempre em movimento, a cada dia, a cada hora, a cada minuto, a vida transita. Para onde? Esta já é outra discussão.
Apesar desta constatação, observo que muitas pessoas preferem viver fixamente, isto é, alguns necessitam de agarrar-se a algo, nossa cultura insiste nisto, precisamos criar raízes, estabelecer vínculos sólidos, é fundamental a nossa espécie a sensação de pertencimento. Creio que tudo isso se inicia no momento que nossa espécie transita de sociedades nômades para sedentárias. No momento em que percebeu-se que era possível estabelecer-se sem mais aquela obrigação de correr atrás da caça.
De qualquer forma, me parece que com o advento do capitalismo passamos a consumir e acumular como loucos, para que? Qual o objetivo deste tipo de sujeito que só faz pensar em acumular e ter? Podemos alegar que estamos pensando nos nossos descendentes, mas na verdade fazemos isto porque de uma forma ou de outra não queremos andar em desconformidade com as regras sociais e as verdades universais.
Ao olharmos ao nosso redor, com alguma lucidez é possível ver que a vida é infinitamente mais que acumular, devíamos apenas viver... seguir a vida com propósitos que sejam mais significativos, como fazer amigos legais e leais, amar, gozar e divertir-se muito. Não consigo imaginar algo mais sensato diante da transitoriedade da vida que isto. O transitório não significa ser vazio ou vulgar, não há problemas em dar sentido as coisas, em buscar uma felicidade duradoura, não é só porque a vida é transitória que vamos nos comportar como se o mundo fosse acabar amanhã.
O que proponho é uma relação de equilíbrio entre “o viva e deixe vive” e “o acumule o máximo que puder.” Poderíamos estabelecer outro conceito, logo, proponho “viva o máximo que puder e acumule o suficiente.” Se a vida é uma grande rodoviária, assim com na canção as pessoas vivem a vida e a percebem de forma diferente, para alguns trata-se de uma dádiva, outros a vê como um carma, eu a sinto como um bem inestimável, embora tenha consciência de sua transitoriedade.
Jonatas C. de Carvalho.