GARELI – QUEM TEVE UMA JAMAIS ESQUECE.

1972 - Gareli Modelo 1971/2,

Muito comum na Itália de fácil locomoção e de baixo consumo de combustível.

Início dos anos 70 e São Paulo não era mais a terra da garoa. Mas uma grande metrópole onde se podia andar a vontade, dia e noite, sem ser assaltado, sem ser incomodado a não ser que perturbasse a ordem pública ou se opusesse ao regime da ditadura militar... a vida era tranqüila.

A cultura estava efervescente, muitos espetáculos na noite paulistana, teatro, cinema, exposições, feiras, etc.

Eu acabava de retornar a casa paterna depois de oito anos estudando em colégio de padres no interior de Minas e de São Paulo.

Depois de quase uma década recluso em uma escola religiosa e ainda com a experiência do serviço militar sentia-me a vontade diante desta nova vida.

Terminado o ensino médio logo tratei de preparar-me para o ensino superior ingressando num curso preparatório.

O trabalho, os estudos e a busca de novas experiências e novos conhecimentos fizeram com que a minha permanência em casa restringisse mais para dormir e nos finais de semana.

O transporte era o que mais preocupava, era precário. Os ônibus muito lotados e poucas linhas. O metrô, ora o metro, este ainda estava no projeto.

Diante da dificuldade de locomoção para o serviço, para a escola eu pensava em comprar uma moto ou um carro usado. Comecei a pesquisar os modelos mais simples de motos, até de carros, mas meu orçamento não era suficiente para tal.

Alguns amigos aventuraram-se na compra de um Gordine, ou Vemaguet (carros populares da década de 60) carros fora de linha de fabricação, outros preferiam motos de 50 cc.

Acabava de chegar no Brasil, a preço popular, a Gareli Modelo 1971/2, muito comum na Itália para fácil locomoção e de baixo consumo de combustível.

Adquiri a minha Gareli e esta passou ser a minha companheira para o trabalho, escola e até para o lazer.

Equipei-a com duas maletas de coro na parte traseira nas laterais do assento do carona para eu transportar meus cadernos, livros e outros objetos.

Este modelo era novidade no Brasil, acho que comprei um modelo que acabava de ser importada, havia poucas unidades. E isto fazia com que chamasse muita atenção das pessoas que questionavam:

Ei!!!

Isto é uma bicicleta ou uma Moto?

Quanto gasta de gasolina?

Etc

Era muito prática e econômica. Seu tanque de combustível havia capacidade de apenas dois litros de gasolina; o suficiente para rodar dezenas de quilômetros sem abastecer.

Incrível!

Apenas havia um problema no dia de chuva, a tração era no pneu traseiro isso fazia com que o motor perdesse um pouco a tração. Em situações normais era a solução ideal, não havia trânsito ruim para ela. E também naquela época não havia tantas motos nas ruas como atualmente. Portanto era tranqüilo transitar por ruas e avenidas de São Paulo.

Trabalhava num Banco Comercial no centro da capital mas o meu serviço era externo e por isso a Gareli muito me auxiliou. Não me preocupava mais com transportes lotados, com o último horário de circulação de ônibus, podia sair e voltar a hora que quisesse. E sempre chegava nos lugares antes de qualquer um, era maravilhoso!

Como disse anteriormente o modelo era inédito, uma pequena remessa havia sido importada da Itália o modelo que era ideal para cidades planas sem muitas subidas. Era normal as pessoas o tempo todo fazendo perguntas. Sempre chamava a atenção por onde passava.

Era leve, silenciosa e econômica. Esta foi minha companheira por mais de dois anos para o trabalho, a escola e passeios.

Nesta nossa parceria alguns acontecimentos marcantes que relato a seguir:

Certa vez voltando para casa pela rua da Moóca, por volta das 21 ou 22 horas aconteceu do pneu traseiro de minha Gareli furar e como não havia meios de consertá-lo ali precisei caminhar empurrando-a em direção de casa. Era uma caminhada de cerca de seis ou sete quilômetros. Caminhava beirando a calçada, mantendo o farol da Gareli aceso. Havia passado diante da Delegacia de Polícia que havia ali na Rua da Moóca e poucos metros adiante passou por mim um automóvel modelo Opala, de vidro fumê que após ultrapassar-me encostou-se ao meio fio e dele desceram o motorista e o carona. Dois rapaz com jeito de “playboy”.

A primeira coisa que passou pela minha cabeça foi a de “problemas a vista”, achei que queriam confusão e eu sozinho, numa rua deserta, sem movimento, o que podia fazer!?

Foi quando um deles se aproximou e veio logo indagando: O que é isso uma bicicleta ou uma moto? - a pergunta que todos faziam.

Ainda um tanto temeroso respondi a pergunta e as demais referente a Gareli que tanta curiosidade despertava.

Foi então que o rapaz perguntou para onde eu estava indo e ao saber que iria para casa em Vila Formosa prontificou-se em acomodar a Gareli no porta mala de seu veículo e levar-me até a casa de meus pais. Com muita educação os dois ocupantes do Opala preto que de início me causou receio ao parar pouco a frente de onde eu estava conseguiram colocar a Gareli, mas a roda dianteira ficou suspensa do lado de fora e era preciso alguem ir dentro do porta mala para segurar a roda para não estragar a pintura do carro.

Foi ai que um deles perguntou se eu me importava de ir no porta mala segurando a parte dianteira da “motoca”. Eu disse que não, de modo algum e assim depois de acomodar-me dirigiram-se calmamente ao endereço a eles fornecido e em poucos minutos estava eu em casa são e salvo e com a minha Gareli. Agradeci aos desconhecidos meio sem palavras os quais retribuíram com um sorriso e um “dinada” e foram-se embora.

Numa outra ocasião o mesmo fato ocorreu mas agora na movimenta Radial Leste, a noite; percebendo a avaria daquela “motoca” sendo empurrando por mim um pequeno caminhão baú parou poucos metros a minha frente e ofereceu-se para levar-me até em casa. E gentilmente deixou-me na esquina da rua de casa.

Seriam anjos ou mensageiros dos mesmos!?

Acreditem ou não, fatos assim sempre acontecem, pelo menos comigo.

Hoje resta-me saudade daquele tempo e ao lembrar destas situações incomuns eu me pergunto por onde andará estas pessoas ?