O INVERNO CONGELA A ALMA
Adoro chuva. Detesto inverno. E não há nenhuma contradição nisso. Minha alma nordestina alegra-se com a chuva. Gosta de sentir-se lavada pela água cristalina que desce do céu. Mas não gosto de inverno. Chuva é transparência. Inverno é cinza. Chuva é alegria. Inverno é tristeza. Chuva é vida. Inverno me lembra velório.
Não gosto de frio. Gosto do calor, da água correndo na pele, refrescando o corpo e a alma. Para mim a chuva sempre foi sinônimo de alegria. A chuva que enche de sonhos e esperança o coração do sertanejo. Que arranca o inverno da alma faminta, assustada pela seca, pela fome.
O cinza do inverno não me remete a neve, a passeios, mas a fumaça de dias sombrios. Onde a água da chuva é implorada aos céus com fé e devoção. Já senti o inverno queimando o meu corpo.
Um inverno tenebroso que fez morada em meu coração na longa seca que castigou meus irmãos nordestinos. Que colocou medo no olhar de um povo valente. Desespero no rosto dos que temiam morrer sem voltar a ver a chuva caindo, os rios transbordando, as açudes sangrando.
Quando o inverno atinge nossa alma tudo perde a cor, não conseguimos nos alegrar com as flores dos cactos que sobrevivem a falta d´água. O canto dos pássaros soam em nossos ouvidos como um grito de desespero e o olhar dos animais parece um pedido de socorro.
Por isso gosto das chuvas de verão que trazem alegria ao nosso sertão, a certeza do alimento farto, da água para matar a sede do corpo e da alma. A chuva que é alimento caindo do céu em nossos campos. Vida em plenitude em nosso coração.