VÍCIOS REDIBITÓRIOS...
Um bom advogado ou um jurista ao ver esse título, certamente, logo pensará que estou querendo falar daquele vício existente nas relações contratuais ou nos negócios comuns que as pessoas se vêem envolvidas, quando algo adquirido não reúne as condições intrínseca acordadas em face de um defeito escondido e não visível ao olho humano. O vício redibitório, no direito civil, caracteriza-se por uma falha ou um defeito imperceptível num objeto qualquer, pois quando observado pelo aspecto externo possui toda uma composição capaz de produzir os efeitos de sua garantia, mas quando observado nos seus aspectos particulares de funcionamento, será observado a precariedade do seu conjunto, porque alguma peça não funciona direito e isso prejudicará o seu conteúdo essencial. Posso usar como exemplo um veículo adquirido com a idéia de que o seu motor estivesse perfeito, mas quando o motor for exigido, acusará problemas ocultos capazes de gerar sua falência total. Assim, um motor fundido retira o valor global do veículo.
Contudo, não se tratam dessas características jurídicas que quero abordar nesta crônica, mas sim sua equiparação ou analogia que fazemos à vida das pessoas, pois sempre que estamos construindo uma amizade, um amor, um novo relacionamento, um contato de emprego, ou qualquer outra atividade no dinamismo do nosso cotidiano, sempre haverá essa questão do “vício redibitório” em tônica, pois ninguém é capaz de compreender os vícios que as pessoas possuem no seu interior, a não ser que os investigue ou que os constate por intuição.
As pessoas em geral possuem muitos vícios...Uns são hipócritas. Outros são “caras-de-pau”. Uns são dissimulados. Outros são inconsistentes. Uns são infiéis. Outros são volúveis. Uns são psicopatas. Outros são passionais. Uns são “traíras”. Outros são medíocres. Enfim, podemos enumerar milhares de atitudes ou condutas que aos olhos nus se mostram corteses, dignos, humanos, mas que se vista em face da convivência veremos verdadeiros monstros que usam de sua imagem natural para prender suas presas, seja para explorá-las como pessoas humanas, ou para torná-las objeto de sua individualidade. Isso acontece em todos os setores de relacionamentos, pois sempre haverá alguém querendo “pisar no pescoço” de outrem para se dar bem na vida.
O curioso disso tudo é que o processo natural de relacionamento entre os humanos é extraído e deve ser absorvido pelo princípio geral de que todos são bons, até prova em contrário. Esse, aliás, é meu lema, pois sempre que conheço uma pessoa fico munido de todas as minhas forças pessoais para recepcioná-la como um ser do bem capaz de reunir naquele momento energias de compartilhamento, pois, afinal, as boas relações só fazem bem. Evidente que no meu íntimo me preservo no direito de ficar atento e alerta, por reconhecer que nem todos são iguais. Não podemos correr o risco de julgar alguém açodadamente e por tal razão causarmos injustiças. Assim, a melhor solução é manter-se em alerta até que o tempo nos faça ver aquela pessoa como ela realmente é.
Já se disse alhures que se quisermos conhecer uma pessoa basta lhe dar poder. Isso é pura verdade, pois o poder aflora os resquícios de egocentrismo nas pessoas, já que elas (em muitos casos) escondem-se nas seus medos e nas suas inseguranças. Quem tem medo e é inseguro não arrisca a enfrentar ninguém, por isso fica escondido nas suas rusgas internas e as abafas enquanto pode. Entretanto, quando esse medo se esvai em face das rédeas do poder, a pessoa não vê mais obstáculo para colocar em cena o seu lado nefasto e assim expõe suas garras.
Por todas essas razões, devemos estar atentos aos “vícios redibitórios” que se escodem por traz da personalidade de uma pessoa. Para mim o defeito mais cruel como comportamento humano é daquele cidadão de “duas caras” que na sua frente é uma coisa e na sua ausência é outra. Estes são muitos. No entanto, não possuem vida longa, pois em algum canto do seu procedimento irão se contradizer, pois tais pessoas vivem em contradição e muitas delas até esquecem do que fizeram algumas horas atrás, acabando por se contradizer algumas horas à frente. Assim, a pessoa precavida não “dá trela” àquele cidadão que muito promete, pois a própria contingência da vida mostra que certas coisas nós não podemos alcançar, considerando que as palavras são muito mais extensivas que as ações. Destarte, uma das regras da boa convivência é ficarmos atentos para aqueles cidadãos que prometem algo inconseguente, ou que nos oferece algum benefício em prejuízo de outrem, pois essa conduta encerra o mesmo princípio da traição já que quem trai um; não custa trair dois, três, quatro...e assim por diante. Olhe, que ainda não estou falando dos políticos!!!
Não obstante, existem “vícios redibitórios” que são compatíveis com nossa convivência diária, porque oriundos de relacionamentos longos e que já se traduziram em defeitos aceitáveis, dentro do princípio da convivência humana, considerando que todos nós temos alguma falha de comportamento, haja vista nossa natureza de errantes, além do fato de vivermos numa sociedade e termos de aceitar alguns paradigmas que muitas vezes não são próprios da nossa vontade. Exemplo disso são os relacionamentos de casais, quando os cônjuges aceitam os defeitos dos parceiros, desde que não seja vícios que possam influir em deslealdade da relação. Assim, normal que o marido fume e a mulher não. Normal que o homem jogue futebol e a esposa aceite essa sua diversão. Evidente que tudo isso deve ser comedido e que não se desnature em elementos de camuflagem, pois existem muitos maridos que saem do futebol e vão para gandaia. Isso já é um vício grave, pois encerra traição.
O importante, porém, é que saibamos separar em nossa vida pessoal as coisas e não misturar os “vícios redibitórios” que possam denigrir a estabilidade de uma relação. Isso serve para todos os setores da vida humana.
Enfim, um vício ou outro que não venha transpor a linha do respeito e da convivência mútua é algo suportável e se torna irrelevante num contexto geral da relação. O que devemos evitar com todas as nossas forças são os vícios que nos tornam reféns da personalidade alheia e que nos tornam infelizes para o resto da vida. Devemos caminhar “com nossas próprias pernas” e não se deixar levar por conceitos errados que as pessoas muitas vezes reservam para nós. O importante é que os “vícios redibitórios” graves podem ser catalogados e, como tal, podem ser extirpados da nossa vida.