DIA DOS NAMORADOS

A madrugada toda chuvosa, entre relâmpagos e trovões dava para ouvir os pingos d’água bater no solo, intermitentes. Quando o dia amanheceu cheguei a acreditar que logo passaria, mas a chuva continuou por quase toda manhã. Uma manhã bastante convidativa para ficar na cama lendo um bom livro, ou assistindo a um bom filme, toda enrodilhada entre os braços quentes do ser amado e um capuchino fumegante depois.

Num dia como este, a saudade ameaça dominar-me e tenho que lutar muito para não entregar-me de uma vez por todas. Vejo-te diante de mim a sorrir, os olhos iluminados de amor. Procuro pensar em coisas alegres para não deixar as lágrimas que me apertam o peito ganharem os olhos, deslizarem pela face.

Todos os anos em que estivemos juntos alimentei a ilusão de que não era preciso dizer-te quanto eu te amava, quanto eras importante, essencial como o ato de respirar.

Tento pensar nos amigos e amigas que também já habitam outro plano, a cada ano esse número se torna maior e breve chegará minha vez. É a lei natural da vida.

Havia uma senhora entre minhas colegas de trabalho que ostentava no peito um medalhão, espécie de camafeu com a foto de seu marido morto. Ah, como costumam ser cruéis, mesmo sem saber, os mais jovens...

Embora nada lhe dissesse eu duvidava um pouco daquela devoção, tantos anos passados. Acreditava que não era possível alimentar tanta saudade, o camafeu continuava ali por vaidade. Até que um dia, sem quem eu fizesse qualquer comentário a respeito, com um sorriso nos lábios e uma ponta de ironia ela fitou-me e disse: “Para você, a vida é muito fácil, ainda tem o seu espírito santo de orelhas...”

Agora também não tenho mais o meu espírito santo de orelhas, e os dias, as semanas, os meses e os anos estão passando; diante do enorme vazio de sua ausência, compreendi que qualquer forma de amor vale a pena.

MCC Pazzola

Olinda, 12/6/2009