22 - EU BEBO, MAS REZO...

22- EU BEBO, MAS REZO...

Essa é uma das muitas histórias que eu trago comigo... Cantou a banda Blitz nos anos noventa. A que eu vou contar agora, tem um quê de triste, pois é um caso de um problema social que sempre afligiu nossa sociedade. E ainda bem, que agora é tratado como doença. Mas não deixa de ter seu lado cômico.

Caso 01- Dos muitos cidadãos que passavam horas e horas lá no boteco do Zé Neto ou no Bar do Pedro Madeira, ambos localizados lá na Praça da Bandeira, ou mesmo no José dos Santos, na boca da Rua Sant’ana, tinha um era freqüentador. Deixar de ir lá só se o sol não nascesse sobre a terra. Nunca perdeu um só dia de serviço, contava sempre. Era assim, desde o tempo em que retirava pedras quebrando os matacos com marretas para encher umas tantas galeotas por dia e, assim, encher a despensa da casa.

Rotina de vida era com ele mesmo: mas, deixar de entornar uma branquinha, daquela preferida, jamais.

Era uma situação vexatória para as famílias saberem que um ente querido estava escornado em algum canto da cidade.

Contam que numa tarde destas, em época de Novena do Patrono da Igreja, ele chegou assim como que de repente, pegou um rolo de lingüiça que trazia mal embrulhado debaixo do braço, desabotoou a braguilha e ficou ali com cara de alívio, pois estava apertado para urinar. Estava tão bêbado que só percebeu a troca infame quando sua botina estava cheia de urina... Saiu dalí esconjurando! Êta pinga danada sô, álcool desdobrado, marvada...

Caso 02 - Embora ninguém tenha o dom de profetizar quanto tempo ainda vai ficar sobre a terra e imaginando que daqui para frente tudo é lucro, ainda mais se sabendo que as possibilidades de progredir não eram tantas lá na empresa, o que lhe restava era viver a rotina.

Dentro desta ótica o dia a dia devia ser como um fardo por demais pesado. Se você não tiver alguma religiosidade e a praticar, melhor ficar fora do ar, como dizia um amigo do meu pai, que não por acaso, foi o meu padrinho de primeira comunhão, lá em Dom Silvério (pequena cidade lá pras bandas de Piracicaba, Sem Peixe e Alvinópolis, duvido que você nunca tenha ouvido falar deste nome).

Dom Silvério era uma cidade que antigamente tinha o nome de Saúde, depois foi rebatizada em homenagem ao Bispo da Igreja católica de mesmo nome.

Em Dom Silvério vivia Orestes. Era um tratorista de segunda linha, ele mesmo dizia, mas achava que o que sabia fazer já estava de bom tamanho, dizia assim, “- vim da roça, só sabia tocar carroça, ora puxada por um burro, ora empurrada por mim, agora já posso tocar minha inútil vida de qualquer jeito. Não sou casado, mas já tive três noivas. Se tomei o tempo delas, e sempre foram longos anos de namoro e noivado, elas também me empataram”.

Na sua simplicidade o filósofo sempre aparecia depois de umas tantas rodadas de cinzano, vermute e traçado, tomadas religiosamente lá no Bar do Matheus “Conhaque não bebo de jeito nenhum. Esse demônio mata a gente!”

Mas ele não perdia a noção das coisas, pois reconhecia em alguns colegas a necessidade de “puxar o freio e beber menos, para beber por mais tempo”.

Subia o “Morro do Cipio que ia dar lá no átrio da Igreja” quase de mão no chão, mas ao chegar lá no alto, parece até que o esforço exigido, mais o “respeito” pela simples presença física da Igreja e os novos ares o reanimavam, embora ainda que restasse uma longa estrada a percorrer para chegar até sua casa.

O desafio agora era se manter de pé. Tomava fôlego sentado na porta da Igreja e, quando se sentia em condições, arrancava, dando passos trôpegos e ziguezagueando pelas ruas.

Ele tinha alguns amigos que depois que ele saia da porta da Igreja, recolhiam os pertences e alguma compra que ele fizera e depois deixavam lá na sua casa que ele chamava de Pensão e dormitório.

Contam, e aí, já não sei se é verdade ou não, que certo dia, ele errou a mão e errou a hora. O sol já estava presente fazia tempo quando ele acordou, procurou água por perto e não achou. Foi apoiando-se na parede, não percebendo que a porta lateral aberta, quase invadiu a igreja.

O Padre no altar falava exatamente sobre os vícios, e ele meio que caindo ouviu atentamente o que restava do sermão, hoje chamado de homilia. Concluindo o sermão o Padre, olhando para o lado em que estava o pinguço, disse: “estes são os pecados dos homens que acabarão por levá-los ao inferno”. Dentro da sua lógica e filosofia o bebum disse:

- O que é isso padre Cláudio...

- Conhaque “eu não bebo”!

Além do mais: - EU BEBO, MAS TAMBEM EU REZO!

CLAUDIONOR PINHEIRO
Enviado por CLAUDIONOR PINHEIRO em 11/06/2009
Reeditado em 21/04/2010
Código do texto: T1644398