Papel em branco

Hoje é feriado, dia preguiçoso, que a cidade dorme até mais tarde. Por descuido não desliguei o rádio relógio que despertou com informações atualizadas do resgate das vítimas da tragédia do airbus A 330. Chove levemente, mesmo assim ouço alguns pássaros cantando acompanhando o ritmo da chuva e vozes de pessoas desafiando a natureza, protegendo-se de suas lágrimas.

O dia está propício para se ficar em casa, não gosto de sair com chuva. Ficarei com a família - mulher e filhas - e procurarei algo para fazer. Escrever uma crônica talvez!

Mas escrever sobre o que? Sento-me em frente ao computador e as idéias insistem em não surgir. Nesta hora é que me defronto com os problemas. De que me adianta se um texto é escrito de forma denotativa ou conotativa. Se objetivo ou subjetivo. Se real ou fictício. O que me importa é a mensagem que assimilei, seja conto, crônica ou outro estilo empregado pelo autor. Se fiz do personagem um herói ou vilão, se devo ou não seguir sua conduta, seu caráter, sua personalidade, seu conhecimento. O que implica é poder passar uma mensagem de forma a acrescentar ao leitor algum conhecimento, Mas, as idéias não vêem.

Penso até em escrever sobre o vôo 447, que a esperança é a última que morre. E, enquanto existir a possibilidade de encontrar sobreviventes, do airbus A330, deve-se alimenta-las – apesar de remota, não é impossível perante Deus. Que a comoção de familiares e amigos que estão abrigados nos aeroportos recebendo assistência psicológica, médica e sendo acompanhadas por assistentes sociais, certamente se estende a todos brasileiros que também se sensibilizam com a tragédia. Porém, as idéias insistem em não surgir.

Logo reflito. Parece-me infantil, mas depois que ouvi o canto desse pássaro pela manhã, percebi que de um tempo para cá eles aumentaram em número. Estão sobrevivendo à ação predatória do homem, ou será que o homem está se conscientizando de sua importância? Entretanto, as idéias não chegam.

Falar sobre o gasto com armamento nuclear pela Coréia do Norte que daria para alimentar todos os famintos do globo, também em nada acrescentaria. Que os assuntos são sempre os mesmo, só mudamos a forma de nos expressarmos, inseridos no processo histórico, também nada adicionaria. Pensar que, enquanto um pássaro luta para sobreviver, nações constroem bombas atômicas para se proteger é insano. Descobrir as causas do acidente do Air-France é de fundamental importância para futuras prevenções, mas sejam os motivos que forem: humanos, mecânicos, meteorológicos, uma coisa é certa: A mecânica não é infalível, o homem é humano, portanto sujeito a erros e a natureza ele não pode dominar. E, as idéias não surgem.

Divago um pouco. Canso de tentar, acredito que hoje não é meu dia de escrever, talvez porque não tenha o dom, ou inspiração, técnica ou mesmo exercício. Mas não desistirei, mesmo que já envelhecido, ficarei com a mente voltada a objetivos fixados. Desligo o computado com o papel em branco, sem tristeza, e fico em companhia de Lygia Fagundes Telles para disciplinar o meu amor.

Edson Alcarde
Enviado por Edson Alcarde em 11/06/2009
Reeditado em 14/06/2009
Código do texto: T1643451
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