O amor não tem idade



Costumo passar as férias numa cidadezinha do interior, onde meu marido nasceu, que tem como principal diversão um clube particula onde as pessoas que não têm acesso, se divertem nos rios quando ainda tem um pouco de água, pois a região é muito seca e na maior parte do ano o rio fica quase seco. 
A feira desta cidade  realiza-se dia de sábado. A casa onde ficamos é uma das mais bem localizadas da cidade, situada na praça, num primeiro andar, fica bem em frente a igreja católica. Da varanda podemos acompanhar todo o movimento da cidade.
 Durante o dia, o calor insuportável não deixa ninguém usufruir da praça, mas a noite vemos as pessoas passando para a missa, para os cultos das igrejas evangélicas... as crianças brincando,namorados se encontrando...
Na sexta a noite a partir das 20 horas, começa o movimento de chegada das pessoas para organizar a feira do dia seguinte.
 então começa o movimento das carroças, dos famosos paus-de-arara entupidos de pessoas que chegam das roças, dos mais variados lugares, para venderem a sua mercadoria no dia seguinte na feira. Os carros-de-boi com as suas rodas de madeira, gemendo por onde passam.
 Esse movimento se prolonga por toda a noite. 
Gosto de levantar cedo, sentar na varanda e acompanhar o início do movimento das pessoas, o vai-e-vem entre as barracas, a pechincha nos preços...tenata coisa me porende a atenção...fico horas nesse envolvimento...mas de repente, um fato me chama a atenção.
 Logo abaixo de onde me encontro, vejo um homem na faixa de seus 75 a 80 anos, vem num cavalo, para, desce e senta num banquinho da praça apesar de todo o sol e calor, em meio a algumas barracas. Muitas pessoas estavão ao seu redor, mas não o notam, não reparam nele, na verdade nem o enxergam. Ele simplesmente é mais um na multidão...e ali no banquinho ele começa a limpar os sapatos, com um pano, puxa as meias, fica de pé folga o cinto enquanto arruma a camisa dentro das calças, volta a fechar o cinto, vai até ao cavalo e de dentro do alforje, tira um saquinho plástico. Volta a sentar-se no banquinho e de dentro do saco ele tira um pente, um frasquinho de perfume, uma brilhantina e um espelhinho oval daqueles vendidos nas feiras. Daí por diante ele passa a se produzir cuidadosamente. Enche o cabelo de brilhantina e começa todo um ritual para pentear o cabelo, ele passa o pente já meio torto pelo uso, aquele pente de plástico flexível que com o tempo vai entortando, e se olha no espelho,  assim ele fica cerca de uns 10 minutos arrumando o cabelo, quando achou que já estava bom, ele pegou o perfume, entornou na mão e começou a passar no pescoço, no rosto, e ainda não conformado com o resultado, começou a respingar o perfume na roupa...quando se deu por satisfeito voltou a guardar tudo no saquinho, deu-se uma última olhada no espelhinho antes de guardá-lo também, volta ao cavalo, abre o alforje e tira de dentro um embrulhinho enrolado em papel de presente.
 Monta com o embrulhinho na mão, mete a espora no cavalo e sai em disparada pela estrada.
 Acompanhei-o até perdê-lo de vista, e fiquei a imaginar, quem seria a musa inspiradora daquele homem, com que cuidado ele se produziu para encontrá-la, seu rosto transmitia um misto de ansiedade e felicidade...então me senti feliz, senti a minha alma explodir de felicidade por aquele homem, que mesmo naquela idade, não tinha desistido do amor, nem tinha desistido de ser feliz, então naquele momento tive certeza de que o amor não tem idade.