MELHOR SERIA O MAR COMO SEPULTURA? (SOBRE O DESASTRE DO AIRBUS - DA AIRFRANCE)
Temos que ser contados. Há uma estatística a ser feita e sempre conferida. Religiosamente, em respeito aos mortos, temos que enterrá-los. “És pó e ao pó voltarás”. Mas, somos contados o tempo todo. Somos praticamente um número na fila, qualquer fila, um número nos documentos, um número mais que um nome nas camas de hospitais e nas sepulturas. Ao viajar, via serviço público de transporte, somos o número de nossas passagens. Ao embarcar somos checados. Se checados, embarcamos. São justas as buscas por sobreviventes. Precisamos de fortes vestígios para declarar a tragédia e contarmos a sua extensão. É humano buscar a ovelha que se desgarrou, assim é o bom pastor.
Uma vez que não há mais a possibilidade de sobreviventes, não doerá mais em nós recolher restos putrefatos dos nossos? Eu me coloco no lugar dos mortos, gostaria que me vissem em situação tão deplorável?
O mar é sagrado, como o é a terra em que vivemos... Os nossos sonhos, a nossa vida, os nossos problemas, tudo de bom e ruim é interrompido pela morte física que é o fim de qualquer mortal. Não é fácil perder um ente querido. Mas não é fácil de jeito nenhum.
Eu penso como se fosse parente daqueles que jazem nas águas do Atlântico: a perda se deu na derrocada do avião em águas geladas e profundas. Não seria melhor lembrar-me daquele que caiu vitimado pela tragédia, no momento da despedida, ou em outros bons momentos da vida? Eu, se fosse um passageiro do voo fatídico, gostaria de ser lembrada como alguém que viajou a negócios, em busca de um sonho ou realizando algo que na certa tinha muita importância em minha vida. Pedaços de mim, não sou eu.
Mas, isso é apenas uma crônica pesarosa, de condoído teor, pelos que se foram e pelos que choram os seus. O que importa é que Deus, àqueles que se despencaram das alturas já recolheu nos seus braços de Pai Misericordioso. E aos que choram na terra, haverá de ungi-los com o bálsamo da aceitação. Isso faz parte da nossa fé.