Rejuvenescimento
A notícia saiu no jornal. Uma senhora de 110 anos, que estava em coma, recuperou a saúde e começou a rejuvenescer. A pele, antes enrugada, pouco a pouco readquiria o viço da mocidade. Um a um despontaram dentes novos, que acabaram por expulsar da boca a dentadura postiça. E os flocos de neve que enfeitavam sua cabeça foram perdendo a alvura centenária, para ficarem negros, novamente, seus cabelos.
E pasmem: até a menstruação voltou, regulamente, como a sugerir o retorno às atividades sexuais e de reprodução que já lhe haviam dado não sei quantos filhos, todos evidentemente concebidos em épocas mais remotas.
E aqui fica o leitor boquiaberto diante do fato, embora ocorrido na China.
Mero sensacionalismo? Teria a mulher sido utilizada como cobaia por algum Dr. Silvana, em experiência destinada a revolucionar o mundo científico? Ou seria o resultado de alguma descoberta no campo genético ou da geriatria?
Vamos que esta última hipótese seja verdadeira. A mulher está mesmo remoçando. Que bom para ela. Voltar a encarar e a viver a vida. Recuperar os sentidos em sua plenitude. Ver. Sentir. Chorar e sorrir. A bengala aposentada no quartinho de despejo. Caminhar por si mesma.
De senhora passar a senhorita.
Mas, oh! ironia. Nem por isso deixará ela de correr contra o tempo. Não deixará de ter no relógio um inimigo implacável, mortal. Um agente fiscalizador do Além, que perdeu a primeira corrida mas não perderá a segunda. Pois há de chegar um dia em que a mulher rediviva vai ter a mesma idade de seu filho mais velho. Depois, a do mais moço. A de seus netos. Bisnetos. Um dia ficará mais nova que o mais novo de seus descendentes.
Voltará ao ventre materno?
Possivelmente. Mas no seio da terra, onde sua mãe já se encontra há décadas, posta em sossego.
De qualquer forma, restará a esse Lázaro de saias, dos tempos modernos (e a quantos lhe imitem o exemplo), o consolo de que, morrendo criança, feto ou embrião, morrerá inocente.
Com a mesma inocência com que morre uma velha de 110 anos.