A vida é simples
Há no terreiro da fazenda uma sensação de que a vida é simples. Os sons dos grilos confundem-se com os gritos da molecada que brinca de cabra-cega no terreiro; a oração que se ouve do oratório da sala é a mesma dos sons do riacho que deságua lá para as bandas do poente; o café que foi socado ao pilão tem aquele sabor da macã de Eva e embriaga o sertanejo que canta ao som do violão.
A mocinha em seu vestido de chita florado e numa rede de algodão ouve os causos dos vizinhos. Há um sorriso em cada chapéu colocado sobre o peitoril da varanda; e os donos, despreocupados, agitam os olhos pensando no milharal que impera majestoso no fundo do quintal. É oferecida uma coalhada numa tigela funda. Os homens são os reis da conversa. Cada fala é seguida da euforia dos compadres e a lua vaga lenta querendo saber quando será a colheita para comer milho assado e provar da canjica.
Na cozinha, algumas mulheres falam dos filhos pequenos e outras comentam de um casamento para o Sábado de Aleluia. Uma delas lembra que haverá churrasco e indaga quem fará os doces. A mocinha que se levantara de sua rede fica vermelha de vergonha por se saber o centro das conversas. Os conselhos acerca da primeira noite de um casal correm soltos.
E lá de dentro de um dos quartos o choro de uma criança vem lembrar que é hora do peito. A mãe, há minutos, já sentia o leite nos bicos dos seios. Os olhos do pequeno beijam o semblante da mãe enquanto uma das mãos descansa no outro seio. O ato de amamentar é o milagre da simplicidade da vida.