Quem encanta a vida não morre
O mestre Sivuca afirmou que “o artista verdadeiro não morre, ele se encanta, porque quem encanta a vida não morrerá jamais”. O próprio Sivuca permanecerá neste mundo eternamente. Na sua terra natal, Itabaiana, pensa-se em construir um memorial para lembrar às gerações de agora e do futuro que naquele lugar nasceu e viveu um dos maiores gênios da música brasileira.
A perda de Sivuca é imensa, mas a perda real só aconteceria se a obra do músico e sua filosofia de vida não fossem continuadas e respeitadas. Esta continuação deve ser uma responsabilidade coletiva, principalmente dos habitantes de sua terra natal. Um bom sinal é, portanto, a promessa do memorial de Sivuca.
Meu temor é que essa juventude continue sendo envenenada pelo lixo musical que é jogado toda hora em suas cabeças virgens, que elas cheguem a confundir o forró de Sivuca com forró de plástico. A mais pura ignorância, que é uma força da natureza, certamente não deixa que eles vejam/ouçam o encantamento da música do mestre, um estado de beleza que só as pessoas com um mínimo de sensibilidade e cultura podem perceber. Isso é impossível para quem é bombardeado toda hora com esses modismos musicais descartáveis. Você não pode ter outra versão de qualquer coisa se só lhe é dado ver um lado. Ninguém que passou a vida toda comendo sarrabulho vai gostar de repente de um bom bife acebolado.
Esse é o problema da falta de opção, principalmente no meio musical. As rádios só tocam lixo dessas bandas de forró pornográfico. Já dizia São Tomaz de Aquino: temo o homem de um livro só. Essas músicas vêm pela mídia em forma de bombardeio aos nossos ouvidos e tomam não só o espaço geral como também as nossas casas, via sons potentes tocando em malas de carros de autênticos “malas sem alça”.
Pessoas que possuem um conhecimento cultural mais amplo repudiam tal forma de expressão musical imposta pela mídia. Daí que eu acho que um memorial de Sivuca teria a missão de se contrapor ao consumo em massa desse tipo de música, que faz as pessoas de pouca informação aderir aos gostos impostos pelas novelas e programas da TV aberta. Um projeto desse tipo deveria contar com opções em multimídia para quem gosta de ouvir música à moda antiga, com bom gosto e riqueza de informações, sem abrir mão das vantagens que as novas tecnologias oferecem (acesso pela internet, downloads, vídeos, etc). O foco seria a música paraibana, tão boa e tão carente de divulgação. Um memorial vivo, dinâmico, que atraia a juventude e seja um contraponto ao mar de lama que vem das rádios comerciais e das falsas comunitárias.
A música de Sivuca sempre estará além desse negócio chamado tempo. Sivuca viverá para sempre, pois sua música permanece. Resta aos que ficaram, aos seus conterrâneos, o dever de respeitar a memória desse músico genial, divulgando sua obra e os artistas paraibanos que têm imenso valor para nossa cultura, mestres iguais ao trombonista Radegundes Feitosa, que simplesmente é o melhor do mundo e não é reconhecido por aqui.