"O MANIFESTO DO DIABO"

Ao soar as badaladas de finados, uma família reunida, cadeiras postas

na calçada;luar morno e nebuloso – ao mesmo tempo brilhante oscilante-ao vento que tangia as folhas da casuarina, quando o relógio harpejava o limite da noite... eis que de repente, um grito de horror saltou do quarto de uma criança adormecida; dançando pelo cômodo,circulando pelas outras dependências da velha mansão, desenhando ecos que acionavam os poros e ocasionavam calafrios. – “Que diacho será isto, disse a mãe empestada!” Os presentes seguiam os ecos, como se prendê-los pudessem , engalfinhando-os no feltro das cortinas,mas tanto porém, se espalhavam alcançando a vizinhança e os demais moradores incontestes acorridos ao local.

Em dado momento, um sacerdote entrou no recinto, repentinamente, o silêncio pesou e uma voz baixou,vindo dos aposentos da criança de timbre grave e volumosa, que dizia:- "Eu sou a maldição que atira pedra enfia rolos de cabelo; entorta cruzetas, empalha frangos e urubus; mói pedra de fogo em dentadura de frade e troca moedas de ouro nos velórios, pela alma depenadora da moral da “besta-fera” do aluvião pecador. Entro e saio encesto no baile de máscaras das alcoviteiras mandrágoras– lindas flores da sociedade decrépita...és meu e eu sou teu!" ... (Um, véu de faíscas choveu do teto,) apareceu o diabo fardado de coronel, com voz de trovão e dedos de espada, prendendo nos dentes a corrente do medo

e os fios da maldade; distribuindo mantos pretos, chifres artificiais e mortos embalsamados, com orelhas de fogo e postura de canibal, oferecendo-se para resolver os problemas do povo brasileiro, propondo-lhe a eleição de grandes bandidos, especuladores e estelionatários. Os espectadores escutavam e rezavam alto, mas, suas vozes em coral, não ultrapassavam os trovões do coronel, no auge de sua altivez. Repentinamente, um dos presentes puxou uma cruz dourada...foi aí que os olfatos se quedaram ao penetrante cheiro de forte odor, acompanhando o estopim de estrondo desarticulado, que desarvorado, rompeu o teto e fugiu.

Nesse instante reaparece o choro da criança que rabisca no lençol, - “O MANIFESTO DO DIABO!...”

Zecar
Enviado por Zecar em 11/05/2005
Reeditado em 20/07/2016
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