PERFIS MARIENSES (3) – Benedita Luiza

Quando Mari me adotou, em 1988, fui exercer a função de chefe da estaçãozinha de trem da cidade. Como quase não passava trem, eu quase não tinha o que fazer na repartição. Com tempo disponível, procurei ocupar-me em atividades relacionadas ao bem estar social e ao meu próprio bem estar. Foi assim que fundei um jornal, um grupo de teatro, uma associação de bairro, uma rádio comunitária, um time de futebol e abri um bar, em sociedade com outro parceiro, só para não ter que sair do bar no fim do dia ou da noite e no meio de um bom papo. Tem coisa pior do que ser convidado a se retirar do bar só porque deu meia noite e o dono quer dormir?

No meu bar, que também servia de sede do meu time, a Associação Atlética do Canteiro, pontificavam sujeitos bons de copo e de papo como Chapéu do Correio, Romildo Ferroviário, Neneu Batista, Fernando Locutor, Carimbó Ferroviário, Doutor Luizinho Dentista, Assis Firmino, Tadeu “Penca Preta” e Manoel Pedro, entre outras figuras da boemia local.

Nas horas vagas (e haja hora sobrando!), eu me inclinava ao serviço voluntário da Pastoral da Criança, que presta serviços não remunerados às crianças pobres das comunidades. Doei meu tempo e minhas habilidades como organizador de grupos na criação e operacionalização de uma sopa comunitária, preparada e servida nos bairros Vermelho, comunidade Santa Júlia, José Américo, Pasto Novo e Procanor. A sede do sopão ficava na estação de trem, onde eu organizava a despensa, formada por doações de alimentos. O projeto atendia a mais de 500 crianças pobres. Um grupo de senhoras prestava-se ao serviço de coletar os alimentos no comércio e na feira, preparar a sopa e, principalmente, acompanhar a saúde das crianças, pesando-as regularmente e combatendo a desnutrição.

As senhoras da Pastoral, engajadas, participantes e conscientes, eram lideradas por Benedita Luiza, uma mulher iluminada. Todos os que doavam seu tempo e esforço eram a isso levados como resposta a uma inquietação interior, à tomada de consciência dos problemas sociais. Tratava-se da luta por um ideal ou ao comprometimento com uma causa. Mas no caso de Benedita, isso era levado até às últimas conseqüências. Esquecia os problemas pessoais na sua dedicação aos mais pobres. Constantemente alegre, trazia sempre uma palavra sedativa e esperançosa para os sofredores. Líder comunitária, catequista da Igreja Católica, Benedita Luiza foi uma das fundadoras do Partido dos Trabalhadores, Rádio Comunitária Araçá e União das Associações Comunitárias de Mari.

Morreu de câncer de mama, doença que a fez sofrer muito. Mas o seu maior sofrimento deu-se em setembro de 2001. Sua filha, Silvana Porfírio, foi encontrada morta, com sinais de tortura e estupro, em um matagal. Dona Benedita era uma pessoa muito conhecida e amada pela comunidade mariense, por isso toda a cidade afligiu-se e deplorou o sinistro acontecimento.

Mari tem a oferecer aos seus visitantes o excelente clima, de temperatura cálida, com níveis de umidade que o torna um dos mais agradáveis e salutares de todo o Nordeste. Tem também exemplos de vida, como de Benedita Luiza, Marizete Vieira e tantas outras figuras, algumas destacadas aqui neste meu depoimento.

Fábio Mozart
Enviado por Fábio Mozart em 28/05/2009
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