O cão chupando manga na terra de Zé da Luz
Neste dia 26 de maio, Itabaiana comemora 118 anos de emancipação política. Quero neste espaço cibernético dizer que muita gente me escreve, pedindo para mudar de assunto. Deixar de falar sobre Itabaiana e sua gente, universalizar mais os temas. Eu, sendo um sujeito nostálgico, e já entrando na meia idade, prefiro fazer essa literatura de segunda tratando de minha aldeia, mesmo porque a própria literatura nada mais é do que a dor recordada, o sonho relembrado, o passado vindo à tona. Escrevendo sobre os fatos passados de minha cidade, esses eventos tão corriqueiros mas imensamente importantes para mim se revestem de permanência, passam a existir além de minha vida mesquinha e serão o testamento de nossa vivência na aldeia de sonhos.
Escrever é algo tão efêmero quanto existir. Falo aqui dos meus desconfortos, de minhas aspirações, e a palavra escrita serve para me reabilitar aos meus próprios olhos. Mas o foco é Itabaiana. Porque já escreveu com maestria o escritor alemão Stefan Heym, que o escritor jamais deve deixar sua aldeia, sua cidade, suas origens. “Entesoure-as no coração, santifique-as em sua mente, pois suas origens lhe dão sua alma, sua humanidade. Ao recordar com paixão de sua terra, você estará escrevendo sobre um lugar em particular, sobre pessoas em particular, mas dará a eles também o que todos reconhecerão, a universalidade do homem e da arte em si”.
Portanto neste dia 26 de maio, gostaria de comunicar que tive um encontro com o cartunista campinense Fred Ozanan, auto didata como eu, jornalista e artista gráfico, chargista político, um dos artistas mais premiados em sua área no Brasil. Esse “cão chupando manga” estava em Itabaiana tratando de um projeto para o memorial de Sivuca, que a prefeita dona Dida vai ofertar ao Município, naquela praça Epitácio Pessoa, a mesma praça onde cansei de brincar, onde levei muitas carreiras do “juiz de menor” Zé Rodrigues pelo grave delito de jogar futebol no meio da rua.
Esse Fred Ozanan foi quem pegou uma cidade chamada Cabaceiras, nos cariris velhos da Paraíba, lugar onde menos chove no Brasil, e transformou aquele burgo numa cidade cenográfica, onde já foram rodados muitos filmes, incluindo a mini-série da Globo, “Auto da Compadecida”. Hoje Cabaceiras é considerada Município Prioritário para o Desenvolvimento do Turismo pela EMBRATUR. Por isso minha alegria em saber que Fred está projetando o memorial do mestre Sivuca, para quem sabe direcionar a velha Itabaiana para o turismo cultural, culinário e ecológico, que esse povo hospitaleiro merece melhor sorte.
Aproveitei e levei Fred Ozanan para visitar o local onde vai funcionar o Ponto de Cultura Cantiga de Ninar, da Sociedade Amigos da Rainha do Vale do Paraíba. Ele ficou encantado com o projeto. Dono de uma peculiar visão crítica do cotidiano, Fred sabe que uma cidade interiorana só terá chance de pensar num futuro melhor se preservar as tradições de sua gente. Ele tem um carinho especial pela arquitetura antiga, fez muitas fotos de nossa ponte velha, dos casarões que restaram e outros pontos históricos.
Fred Ozanan, em sua genialidade, vendeu o sol como atração turística de Cabaceiras! Esse “embaixador do Nordeste”, como o trata o poeta campinense Manoel Monteiro, pega sua paixão pela cultura popular, consegue “dar forma ao imaginário” e transforma a riqueza cultural do interior da Paraíba em possibilidades de desenvolvimento econômico para nossas cidades tão pobrezinhas. Por isso meu entusiasmo ao ver a intenção de parceria do mestre Ozanan com a Prefeitura local. Porque Itabaiana oferece aspectos culturais únicos de interesse para o turista cosmopolita. É só acreditar em nosso potencial e contar com artistas do naipe de Fred Ozanan.
A ousadia é que faz grandes idéias tornarem-se realidade. A vontade política, o olhar lúcido e comprometido com o bem estar social, também. Mas é necessário que isso esteja aliado à idéia de um desenvolvimento comprometido com a cultura local. Assim, é possível um turismo cultural garantidor da preservação do patrimônio cultural e natural. Somente dessa forma, a sustentabilidade não se restringirá a aspectos econômicos, mas também atentará para o respeito aos cidadãos e às comunidades locais. É isso que aspiro neste 26 de maio, quando também se comemora aniversário do mestre Sivuca.