A estação ferroviária de Mari
A cidade de Mari, antiga Araçá dos Luna Freire, começou sua urbanização a partir da inauguração da estrada de ferro, em 1883. A estação ferroviária foi o primeiro prédio público a se erguer naquela vila incipiente. Ainda hoje o prédio permanece com as mesmas características.
No ano de 1988, fui transferido de Itabaiana para Mari, assumindo a chefia daquela estação, empregado que fui da extinta Rede Ferroviária Federal, onde alcancei a aposentadoria por tempo de serviço.
Em Mari, dediquei-me às minhas paixões: o teatro, a cultura em geral e o futebol. Fundei a Liga de Futebol e o Coletivo Dramático de Mari, além da Sociedade Cultural Poeta Zé da Luz e o jornal Alvorada, que deram origem à Rádio Comunitária Araçá.
O velho prédio da estação foi tombado através do Decreto 8.659, de 26 de agosto de 1980, publicado no Diário Oficial de cinco de setembro daquele ano. A edificação estava, legalmente, aos cuidados do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba.
Tive o desprazer de fechar oficialmente a velha estação, depois que o Presidente Fernando Henrique Cardoso cedeu a um grupo empresarial a rede de ferrovias do Nordeste, cujo primeiro ato foi fechar o trecho entre Paula Cavalcante e o vizinho Estado do Rio Grande do Norte, isolando, portanto, as cidades da região, que ficaram sem o trem. Fui o último chefe daquela estaçãozinha. Em 1997, a Rede Ferroviária enviou ofício à Sociedade Cultural Poeta Zé da Luz, informando que a estação não poderia ser cedida à nossa entidade, “porque o consórcio que administrava a ferrovia iria necessitar do prédio”. Começou então uma luta pela cessão da velha estação à Sociedade Zé da Luz, que já discutia a fundação de uma rádio comunitária para funcionar em suas dependências.
Apelamos para os deputados paraibanos com mandato federal em Brasília. O primeiro a nos responder foi Ivandro Cunha Lima, que deu sua contribuição para a celebração do convênio entre a Sociedade Zé da Luz e a ferrovia, cedendo o prédio da estação para nossas atividades culturais. Era a preservação de um bem de valor histórico para uma finalidade nobre: produzir cultura e arte. Mas os caminhos burocráticos foram tortuosos, levando quase dois anos para se concretizar o convênio. Para isso o então prefeito de Mari, Manoel Monteiro, deu também sua colaboração, intermediando o diálogo entre as autoridades do setor e os artistas empenhados na concretização daquele sonho: salvar a estação e dar-lhe uma destinação digna. Ainda estava recente o triste episódio da demolição da estação da vizinha Sapé. Em meados de 1996, o então presidente da Sociedade Cultural Poeta Zé da Luz, nosso amigo Manuel Batista, atualmente exercendo o cargo de Diretor de Cultura em Mari, recebeu a notícia de que o convênio não seria assinado. Pedimos mais uma vez aos deputados federais sua interveniência na solução do pleito. Os deputados Roberto Paulino, José Luiz Clerot, Álvaro Gaudêncio Neto e Cássio Cunha Lima, além dos senadores Ney Suassuna e Ronaldo Cunha Lima contribuíram com a iniciativa, encaminhando reiterados pedidos ao Ministério dos Transportes e à Rede Ferroviária Federal, na época dirigida por Isaac Popoutchi, que sempre respondia: “estamos analisando o pedido”. Só queríamos o comodato para cuidar do prédio histórico da Estação, mas os burocratas não acenavam com nenhuma solução.
Os deputados e senadores voltaram a pedir uma solução para o caso, acionados que eram constantemente pelos nossos reiterados pedidos de ajuda.. Por fim, a RFFSA pediu um projeto detalhado das intervenções necessárias para a adaptação do prédio às funções de sede de atividades culturais. Este projeto deveria ser feito pela Prefeitura local, que não estava muito interessada na questão. Formulamos então o projeto e encaminhamos ao prefeito, que assinou. Pediram cópia do estatuto da Sociedade Zé da Luz e dezenas de outros documentos. Como é difícil proteger e valorizar os bens culturais neste país!
Por fim, o comodato foi realizado, estava preservado nosso marco histórico. Na ocasião, montamos uma biblioteca, e em 1998 instalamos o estúdio da Rádio Comunitária Araçá, cuja história eu conto no meu livro DEMOCRACIA NO AR.