Um homem honesto

Hoje ele descansa na paz reservada aos que fazem história. Andava de branco, paletó de linho, elegância e nobreza que nele pareciam naturais, sem afetação. Praticava o bem com o ar mais natural desse mundo, receitando as pessoas pobres no meio da rua, sem qualquer ranço de populismo ou falsa grandeza de caráter.

Assim era o médico Everaldo de Morais Pimentel, um homem honesto. Meu pai foi secretário da Prefeitura de Itabaiana, quando ele exerceu o cargo de prefeito, nos idos de 1965. Ele era honesto, mas não fazia alarde. Não se julgava nessa conta. Era aos olhos da própria consciência, e isso lhe bastava.

Hoje, um prefeito tem as contas aprovadas no TCE e disso faz propaganda. Hoje se precisa de aplausos e até consagrações para quem apenas cumpre seu dever.

Meu pai Arnaud Costa narra um episódio que diz bem do caráter do Dr. Everaldo. Quando assumiu o cargo, arrumou uma verba para renovar a rede elétrica da cidade, e para isso abriu licitação, ganhando uma firma do Recife, que deveria fornecer os postes. Ao chegar na dita empresa, Dr. Everaldo foi levado ao escritório do gerente, que apresentou as notas fiscais e demais documentos para a transação, enquanto os postes já estavam sendo colocados nos caminhões. Em dado momento, o gerente cochichou:

- Olhe, é praxe da casa, em casos como esse, dar 5 por cento de comissão para o prefeito que nos honrou com sua preferência. Já está tudo embutido nas notas fiscais e recibos.

- Pois então mande descarregar os caminhões, respondeu calmamente Dr. Everaldo. Isso é roubo, e não faço negócio com ladrões.

Anos depois, quando Dr. Everaldo não mais exercia o cargo de prefeito, é que viemos saber desse procedimento. Ainda hoje ele é lembrado como um político honesto, mas na verdade não chegou a ser político. Entrou na vida pública por acaso, na chapa do prefeito Hugo Saraiva, cassado pelo golpe militar de 1964. Terminou o mandato, fez muita coisa por Itabaiana, destacando-se a obra de instalação da água encanada, sonho antigo dos itabaianenses. Mas a grande obra dele foi desempenhar na formação da juventude do seu tempo esse tipo de exemplo de bom caráter e dignidade.

Há pessoas que até para fazer o bem são discretas. Assim era Dr. Everaldo de Morais Pimentel. Ainda hoje o vejo no seu fusca vermelho e branco, cores do seu querido Clube Náutico Capibaribe, que o levava para os compromissos oficiais sem que para isso a Prefeitura tivesse que desembolsar os gastos com combustível.

Naquela época, a Prefeitura controlava o serviço de fornecimento de energia elétrica, adquirindo energia na Chesf, sem intermediação, e distribuindo na cidade. Os funcionários não pagavam a conta da luz, isenção determinada por lei. Pois o prefeito Everaldo fazia questão de pagar seu consumo de energia. Imagino o seu acanhamento se chegasse a ver a que ponto chegou O serviço público, com testemunhos sistemáticos de operações e atos suspeitos por parte de autoridades públicas diariamente expostos na imprensa, com fraudes municipais de toda ordem.

O exercício da cidadania pressupõe indivíduos que participem da vida comum. Organizados para alcançar o desenvolvimento do local onde vivem, devem exigir comportamento ético dos poderes constituídos e eficiência nos serviços públicos. Um dos direitos mais importantes do cidadão é o de não ser vítima da corrupção. De qualquer modo que se apresente, a corrupção é um dos grandes males que afetam o poder público, principalmente o municipal. E também pode ser apontada como uma das causas decisivas da pobreza das cidades e do país. Combater e denunciar a corrupção é uma forma de homenagear pessoas como o ex-prefeito Everaldo Pimentel.

Fábio Mozart
Enviado por Fábio Mozart em 23/05/2009
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