A INOCÊNCIA E A LÓGICA DA CRIANÇA

Eu estava, certo dia, em uma loja onde são editados e vendidos cordéis, quando tive o prazer de conhecer uma jovem senhora que observava extasiada a diversidade de trabalhos ali expostos. Na verdade, antes das apresentações, eu notara que ela era sorria enquanto eu argumentava, veementemente, contra o exagerado valor atribuído ao conhecimento acadêmico e a minimização do saber popular. Naquele instante, ela veio e puxou assunto sobre a importância dos cordelistas, destacando o fato de abordarem, com muita propriedade, os mais inusitados temas. Em seguida, falou sobre o seu pai, que escrevera um único livro, mas que deixara grandes legados de sabedoria, um dos quais serviu para amenizar o medo de trovão e relâmpago que atormentava um netinho de 3 anos de idade, não por acaso, filho da mãe-narradora. Seguindo o relato, historiou que pôs a criança no colo, para explicar tais fenômenos naturais, e disse: meu filho, o barulho do trovão que nós ouvimos é de Deus arrumando a casa, como a mamãe faz todos os sábados. Para demonstrar, arrastou uma mesa e uma poltrona, de modo que a criança ouvisse o som resultante, e perguntou: não é parecido com o barulho do trovão? O menino, atento, acenou positivamente com a cabeça. Na sala, fez-se um silêncio sepulcral enquanto ela esperava pela próxima reação do pequeno. Quase que imediatamente, ele indagou curioso: e o outro, aquele outro? Ah, o relâmpago, é Deus tirando a nossa fotografia para ver o que estamos fazendo aqui embaixo! Dito isto, pôs-se a ninar a criança, que adormeceu tranqüila. No outro dia, em uma manhã de céu nublado, sob a barulheira dos trovões e a luminosidade dos relâmpagos, surpreendeu-se ao encontrar aquele filho, a fazer poses, no quintal da casa. A mãe, àquela altura, com uma sensação mista de apreensão e alegria, exclamou: venha para dentro de casa; o que você está fazendo aí fora? Ao que a criança respondeu: estou aqui para Deus me ver e tirar a minha fotografia!