BAR DO POVO

No domingo à tarde, depois do jogo de futebol, os dois amigos, Aldir e Eugênio, se encontram no Bar do Povo, ainda de chuteiras, meião e o calção do uniforme. A camiseta, suada e suja, de um e outro, atirada nos ombros. Estão eufóricos: a seleção de Bandeirantes, da qual fazem parte, goleou a de Jaraguari. Chegam ao balcão. Eugênio pede ao Zé Inácio uma branquinha no capricho, uma Antarctica “estupidamente” gelada e dois copos. Sentam nos bancos de ferro ao pé do balcão. Ali perto está o professor Francisco, bebendo seu tradicional conhaque Dreher e dando palpites no jogo de sinuca entre Rodriguinho e o Seu Rubens, da exatoria. As outras mesas também estão ocupadas. Meninos estão escorados nas paredes, assistindo as partidas. Jovens e velhos tomam suas cervejas, sentados nos bancos e cadeiras esparramadas pelo bar. Falam alto e ao mesmo tempo. A fumaça dos cigarros sobe, torna o ar denso, como nos “saloons” dos filmes de faroeste norte-americano.

Terminada a partida, seu Rubens vai ao banheiro, tirar “água do joelho”. Rodriguinho inicia uma partida com um peão da fazenda Sapé, que estava ali há horas, querendo jogar. Era uma figura esdrúxula, com um sombrero na cabeça e bigode à Salvador Dali. Ele ganhou uma partida e Rodriguinho outra. Partiram para a “nega”. O peão da Fazenda Sapé, já na quinta garrafa de cerveja, ria, cabulava o Rodriguinho dizendo que a “nega” já estava no papo. Rodriguinho, malandro velho das mesas de sinuca, olhava o caboclo de soslaio, risinho maroto no canto da boca, como quem tem um às na manga da camisa. Lá para as tantas, o jogo pau a pau, o sujeito encrespa, diz que Rodriguinho está lhe roubando, escondendo bolas. Rodriguinho xinga-o, ele xinga Rodriguinho. E os dois se engalfinham, rolam no chão, trocam socos. Ágil, Rodriguinho desvencilha-se, pega um taco de sinuca e quebra-o na cabeça do peão, que cai desmaiado e com um grande corte na cabeça. Zé Inácio chama a polícia e corre a acudir o freguês, a levantar mesas, a varrer os cacos de copos e cervejas que se quebraram na confusão. A galera que correra para a rua retorna curiosa, rindo, comentando. A polícia chega e leva o sujeito ferido. Rodriguinho, por sua vez, vazara, desaparecera sem ser visto. Na verdade, o Brizola dera um jeito de fazê-lo escapar pelos fundos. Foi melhor assim, todo mundo ali é seu amigo e ninguém queria ver o velho Mateus pôr as mãos nele.

Momentos depois o Bar do Povo retoma a calma e o burburinho costumeiro do pessoal nas mesas de sinuca. Para animar, Zé Inácio põe uma fita do Milionário e José Rico, com o grande sucesso “Estrada da Vida”. Todo mundo sorri e se diverte. Ao anoitecer, Aldir toma a “saideira”, não aguenta beber mais, está de asa. Além do mais, tem uma casa pra pintar amanhã de manhã. Eugênio permanece no Bar, jogando palitinhos com o Seu Rubens e outros amigos. Lá fora, um céu bonito, de poucas estrelas, e a lua nova ronronando por sobre os telhados.