CARCAÇAS DE FRANGOS
André está desempregado há quase um ano e cansado de procurar emprego em vários lugares, recebendo sempre um não como resposta. Para ganhar alguns trocados, ele faz biscates como ajudante de pedreiro, objetivando garantir o leite do pequeno Moisés, seu único filhinho com apenas uim mes de vida. Carla, sua esposa é mulher pouco exigente quanto a luxo, ficando satisfeita em ter o que comer, onde morar e produtos de limpeza para deixar a casa sempre com o seu toque pessoal: perfumada e bem arrumada.
André e Carla já enfrentaram muitas crises no relacionamento matrimonial de nove anos, porém essa enfrentada no momento, parece a pior de todas.
Numa segunda-feira pela manhã, André e Carla despertam e se ajoelham aos pés da cama, pedindo ao Deus Criador em oração, uma orientação, uma luz para a densa treva enfrentada. A despensa está vazia, a geladeira vazia, porém a fé e a confiança no Deus Criador permanecem inabaláveis. Essa fé é justificada pelo fato de o casal frequentar uma igreja evengélica, sendo membros batisados antes mesmo de se casarem.
Somente com o dinheiro da passagem de ida naquela mesma manhã de segunda-feira, André resolve procurar um rico empresário, amigo de infância, morador de uma cidade bem distante dalí. Cheio de esperança, André vai pensando no caminho em como seria a receptividade do rico amigo. Durante a viagem, passam na cabeça de André as imagens da infância de ambos, que eram amigos inseparáveis e aprontaram muito juntos.
Chegando à cidade de destino, após quatro horas de viagem, André está cansado, faminto e sem dinheiro no bolso, nem sequer para fazer um lanche.
Não foi preciso buscar muita informação para descobrir logo a empresa do amigo que há tempos não via por circunstâncias do destino, que separa os amigos com a intençao de provar futuramente se a amizade existiu algum dia ou se não passou de uma farsa.
O portão de entrada é imponente. Todo trabalhado em metal fundido com um gigantesco F, de Fred é claro, rico empresário do ramo de importações e exportações.
Após identificar-se na recepção e falar previamente com a recepcionista, frisando ser amigo de infância do manda-chuva, André é enviado a uma sala de espera luxuosa, onde uma linda secretária bem educada o atende, dizendo que já está a par da situação e que o chefe irá recebê-lo logo.
São vinte minutos de espera, quando Silvia, a secretária linda e educada recebe o ok do chefe via telefone para receber o amigo. André é conduzido ao luxuoso escritório com potente ar refrigerado e de uma decoração de bom gosto que só é possível aos milionários possuírem.
- E aí meu amigão, como está você? O que você manda? Há quanto tempo rapaz a gente não se vê? - Pergunta o gordo, rico e careca Fred, dando um apertado e aparente caloroso abraço no amigo de infância.
- São exatos dez anos Fred! A última vez que nos vimos foi naquela pelada lá na sua fazenda, quando você resolveu reunir pela última vez os seus amigos de infância. Porque nunca mais você promoveu encontro como aquele? - Pergunta André.
Antes de responder, Fred acende um charuto cubano, reflete um pouco e impregnando o ar de fumaça com generosas baforadas responde:
- A vida muda meu amigo. Eu mudei. Hoje sou um homem extremamente importante e sem tempo a perder, afinal, tempo é dinheiro. Nesse momento o telefone toca e Silvia avisa a Fred que os empresários internacionais chegaram para uma reunião extremamente importante e previamente agendada. E ele continua:
- O que o traz aqui amigo, em que posso ajudá-lo?
- Estou desempregado e com a despensa vazia e em nome da nossa amizade, gostaria de saber o que podes fazer por mim e por minha família no momento? Na verdade eu vim pra cá, somente com o dinheiro da passagem de vinda, sem ter nem mesmo recurso para retornar! - Comenta André.
- Infelizmente amigo, emprego eu não posso te dar, mas vou te ajudar um pouquinho, no que estiver ao meu alcance - Diz Fred. E tirando a carteira do bolso oferece ao amigo R$ 50,00 (Cinquenta reais), dizendo ao amigo que a ajuda não terminava alí. Disse ainda que a Silvia já fora orientada para dar-lhe uma ajuda complementar, afinal amizade é amizade. E continuou: - infelizmente eu tenho de receber agora os empresários estrangeiros, porém se precisar novamente de mim, me procure! E novamente abraçou o amigo que retrucou:
- Que O Deus Criador a quem sirvo, retribua-lhe Fred, segundo a sinceridade do seu coração! Obrigado pelo que está fazendo!
Silvia entrega uma autorização assinada pelo Fred para que André se dirija a um açougue de propriedade de um amigo do Fred e lá, um enorme e pesado saco de carcaças de frangos é entregue ao André que ao receber aquilo, teve o enorme desejo de deixar alí mesmo, porém não estava em condição no momento de dar-se ao orgulho.
André coloca com esforço o saco de carcaças de frangos nas costas e começa a caminhar em direção à pista principal para pegar o ônibus de volta ao seu destino. De repente um fusca buzina-lhe e para. São duas amigas de infância de André que lhe oferecem carona, o que é aceito de bom grado. A carona veio a calhar, pois André foi deixado bem próximo à sua residência.
Chegando em casa, André conta todo o ocorrido a Carla e os dois se ajoelham novamente e oram por Fred, alguém digno de pena, que acha que uma amizade de infância vale apenas R$ 50,00 (Cinquenta reais) e um saco de carcaças de frangos.
André uma semana depois conseguiu um emprego digno e hoje sustenta a sua família com dignidade.
André descobriu que Fred não era seu amigo e com o seu primeiro salário, fez questão de devolver os R$ 50,00 ao amigo, além de um saco de peito de frangos com o seguinte bilhete:
Amigo Fred: desculpe por um dia ter te procurado e tendo para oferecer-me somente um saco de ossos, decidí além de devolver-lhe o que me emprestaste, também um saco de peito de frangos, porque tenho a convicção de que aos amigos devemos oferecer sempre o melhor.
Cuidado com as amizades, porque podemos descobrir de forma dolorosa, que as pessoas nos valorizam muito menos que imaginamos.