Itabaiana e a Revolução de 30
“Onde começa a história de um povo? Em que túmulos, em que tumultos está ela oculta? O que está exposto à luz do sol, o que é subterrâneo? Qual a verdade dos textos didáticos? Qual o valor da cultura acadêmica, universitária, oficial? Qual a história mal contada, perdida, obscurecida? Quem faz a História? MARCOS FAERMAN
Itabaiana ficou marcada na História por ser uma cidade valente, de gente destemida. Aqui travaram-se muitas lutas políticas, desde os conflitos pela independência até a Revolução de 30. Nossa cidade foi a primeira na Paraíba a aderir ao levante de 1817. Os rebeldes decretaram a igualdade e o fim da escravidão, sofrendo as pesadas represálias de D. João VI.
Na revolução de 30, o caldo engrossou porque João Pessoa quis mudar hábitos arraigados na cultura paraibana de uma vez só, passando por cima de estruturas de poder influentes nas províncias.
Ao assumir o Governo, João Pessoa mandou desarmar os coronéis do interior, entre eles o famoso Manoel Borges, de Mogeiro. “Em fevereiro de 1929, chegou na capital um caminhão carregado de armas apreendidas nos municípios do interior, dos chefes políticos. Inúmeros fuzis, rifles, pistolas e milhares de cartuchos, além de algumas centenas de facas e punhais”, conforme narra Joaquim Moreira Caldas no livro Porque João Dantas Assassinou João Pessoa. O intuito era desmoralizar as lideranças políticas fiéis ao seu tio Epitácio Pessoa e criar uma imagem de estadista moderno, para se apresentar como novo líder, “abolindo práticas da vida social, provocando desagregação e ameaçando romper a vida da coletividade”, na visão do autor, que considerava João Pessoa um autêntico tirano.
Heráclito Cavalcante Carneiro Monteiro foi chefe político de Itabaiana até 1915, quando passou a exercer o cargo de Desembargador. Mas nunca deixou de ser influente no Município. Na revolução de 30, coube a ele um papel que muita gente desconhece: o de co-réu no assassinato do próprio João Pessoa.
Deu-se que João Pessoa passou a perseguir fiscais de renda, juízes, promotores e desembargadores que não liam pela sua cartilha. Prefeito ou administrador de mesa de renda que não fosse do seu esquema político, ele sapecava o “título” de ladrão e exonerava o sujeito, prendia e expulsava militares da Polícia e qualquer funcionário, desde um simples soldado de polícia a um Promotor Público.
No Tribunal de Justiça do Estado, João Pessoa mirou seu canhão devastador contra muitos desembargadores, entre eles Heráclito Cavalcante, decretando sua disponibilidade. Daí começou a pendenga.
João Dantas escreveu em 1928: “o novo Presidente continua a tocar o pau sem dó nem piedade em quase todos os municípios, isto é, nos chefões desses municípios. Não tem distinguido grande nem pequeno. Tem demitido todos os delegados que praticam violências e expulsado os soldados espancadores”. Era a confissão do futuro assassino de João Pessoa, de que admirava os novos métodos do governante. Depois, quando João Dantas viu os interesses de sua família sendo contrariados pelas ações governamentais, passou a ver em João Pessoa um arrogante perseguidor.
O chefão de Itabaiana, Heráclito Cavalcante, passou a agir na oposição ao Presidente João Pessoa. Morto João Pessoa, abriu-se o inquérito onde se conclui que “o criminoso não agiu sem a colaboração moral e intelectual de outros inimigos”. Foram presos e depois assassinados na prisão em Recife, João Dantas e seu cunhado Augusto Caldas, e denunciados Júlio Lyra, João Suassuna e Heráclito Cavalcante. Depois da morte de João Pessoa, seus adeptos queimaram a casa de Heráclito Cavalcante em Itabaiana e perseguiram seus familiares.
O Promotor Cândido Marinho, responsável pelo inquérito, envolveu todos na denúncia, por mais que João Dantas afirmasse que era o único responsável pela morte de João Pessoa. Ao final, entretanto, afirmava-se que era “negativa a prova dos autos em relação à co-participação de Heráclito Cavalcante no delito”.