Não É Tão Bonito Afinal
Ele se aproximou curioso, um tanto desconfiado, mas cheio de esperanças. Fez um charminho, eu correspondi. Ele balançou a calda grossa, apenas da metade para baixo, o rabo ainda meio travado entre as pernas, numa inequívoca confusão de sentimentos: medo e alegria. Essa reação é comum em animais abandonados, acostumados que estão a não terem família, a serem escorraçados, espancados e mal tratados por um, alimentados e afagados por outros.
Fui mais enfática na festinha, ele entendeu o recado e também já se soltou mais. Deu pulinhos, quis me lamber.
- Ele tem dono? Já o viu por aí? - Perguntei ao rapaz da loja que acabava de despejar minhas compras no porta-malas.
Ante a negativa dele, nem pensei mais nada. Coloquei a criaturinha relutante no carro e voltei pra casa. Finalmente, meu primeiro resgate, pensei, orgulhosa, ante a realização do meu sonho romântico de fazer mais pelos pobres bichos do que anunciá-los no site da Proanima.
Não é tão bonito assim, como eu havia imaginado. O cachorrinho estava muito sujo, fedorento, assustado. Talvez, andando de carro pela primeira vez, tentou subir no meu colo. Lembrei-me da minha tia que, uma vez, bateu o carro numa situação semelhante, por causa de um cão que recolheu nas ruas e que pulou sobre ela enquanto dirigia. Felizmente ele apenas sujou meu vestido novo. Dei-lhe o nome de Xexéu tamanho era seu fedor.
Tomei uma bronca do marido por não termos acomodações para deixá-lo em quarentena, arriscando a contaminar nossas meninas com qualquer doença que ele possa ter. Acordei às três da manhã e, preocupada por saber que ele tem razão, não consegui voltar a dormir.
No dia seguinte, levei-o ao veterinário. Apesar do banho, da alimentação de qualidade, da água e das acomodações limpas à disposição, Xexéu amanheceu quase tão xexelento quanto no momento de sua captura. Percebi que o cheiro vem de dentro: a cada vez que o bicho expira, empesta tudo com um nauseabundo cheiro de carniça. Ele saliva muito, está sempre com um filete de baba gosmenta pendurado na boca. Também não consegue respirar com a boca fechada, provocando um pequeno estalido a cada vez que inspira. As orelhas estão feridas das bicheiras, o pescoço tem cicatrizes, como se alguém tivesse tentado decapitá-lo e o rabo parece meio desconjuntado.
É triste a situação do bichinho. Não é mesmo muito bonito.
Enquanto é examinado, Xexéu se mostra dócil, gentil. E confiante. Em mim. É inacreditável. Não tem nem vinte e quatro horas que somos amigos e, neste tempo, talvez tenhamos estado juntos por umas duas horas, no máximo. Mas, enquanto se deixa apalpar, medir, deitar, sentar e levantar, ele me vigia atento. E ante meu sorriso carinhoso, percebe que apesar de tudo ser tão estranho, ele está bem agora. Está seguro. Quando liberado das mãos profissionais, é aos meus pés que se refugia. Ao perceber uma oportunidade de fuga, pensa em aproveitá-la. Mas para a alguns metros para me esperar, quase me chamando. Enquanto aguardamos o parecer do médico, ele se acomoda sob a cadeira que eu ocupo e dorme, despreocupado. Talvez, pela primeira vez, em meses.
Xexéu fede, muito provavelmente está doente, tem feridas, tem medo... Mas, confia e segue mansamente quem se propõe a lhe dar um pouco de amor.
Não. Não é tão bonito afinal.
É lindo!!
***
Adote um animal abandonado. Procure a Zoonoses ou a Sociedade de Proteção Animal de sua cidade. Se tem uma coisa que não tem preço, é o amor que um bicho desses é capaz de dar.
Ele se aproximou curioso, um tanto desconfiado, mas cheio de esperanças. Fez um charminho, eu correspondi. Ele balançou a calda grossa, apenas da metade para baixo, o rabo ainda meio travado entre as pernas, numa inequívoca confusão de sentimentos: medo e alegria. Essa reação é comum em animais abandonados, acostumados que estão a não terem família, a serem escorraçados, espancados e mal tratados por um, alimentados e afagados por outros.
Fui mais enfática na festinha, ele entendeu o recado e também já se soltou mais. Deu pulinhos, quis me lamber.
- Ele tem dono? Já o viu por aí? - Perguntei ao rapaz da loja que acabava de despejar minhas compras no porta-malas.
Ante a negativa dele, nem pensei mais nada. Coloquei a criaturinha relutante no carro e voltei pra casa. Finalmente, meu primeiro resgate, pensei, orgulhosa, ante a realização do meu sonho romântico de fazer mais pelos pobres bichos do que anunciá-los no site da Proanima.
Não é tão bonito assim, como eu havia imaginado. O cachorrinho estava muito sujo, fedorento, assustado. Talvez, andando de carro pela primeira vez, tentou subir no meu colo. Lembrei-me da minha tia que, uma vez, bateu o carro numa situação semelhante, por causa de um cão que recolheu nas ruas e que pulou sobre ela enquanto dirigia. Felizmente ele apenas sujou meu vestido novo. Dei-lhe o nome de Xexéu tamanho era seu fedor.
Tomei uma bronca do marido por não termos acomodações para deixá-lo em quarentena, arriscando a contaminar nossas meninas com qualquer doença que ele possa ter. Acordei às três da manhã e, preocupada por saber que ele tem razão, não consegui voltar a dormir.
No dia seguinte, levei-o ao veterinário. Apesar do banho, da alimentação de qualidade, da água e das acomodações limpas à disposição, Xexéu amanheceu quase tão xexelento quanto no momento de sua captura. Percebi que o cheiro vem de dentro: a cada vez que o bicho expira, empesta tudo com um nauseabundo cheiro de carniça. Ele saliva muito, está sempre com um filete de baba gosmenta pendurado na boca. Também não consegue respirar com a boca fechada, provocando um pequeno estalido a cada vez que inspira. As orelhas estão feridas das bicheiras, o pescoço tem cicatrizes, como se alguém tivesse tentado decapitá-lo e o rabo parece meio desconjuntado.
É triste a situação do bichinho. Não é mesmo muito bonito.
Enquanto é examinado, Xexéu se mostra dócil, gentil. E confiante. Em mim. É inacreditável. Não tem nem vinte e quatro horas que somos amigos e, neste tempo, talvez tenhamos estado juntos por umas duas horas, no máximo. Mas, enquanto se deixa apalpar, medir, deitar, sentar e levantar, ele me vigia atento. E ante meu sorriso carinhoso, percebe que apesar de tudo ser tão estranho, ele está bem agora. Está seguro. Quando liberado das mãos profissionais, é aos meus pés que se refugia. Ao perceber uma oportunidade de fuga, pensa em aproveitá-la. Mas para a alguns metros para me esperar, quase me chamando. Enquanto aguardamos o parecer do médico, ele se acomoda sob a cadeira que eu ocupo e dorme, despreocupado. Talvez, pela primeira vez, em meses.
Xexéu fede, muito provavelmente está doente, tem feridas, tem medo... Mas, confia e segue mansamente quem se propõe a lhe dar um pouco de amor.
Não. Não é tão bonito afinal.
É lindo!!
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Adote um animal abandonado. Procure a Zoonoses ou a Sociedade de Proteção Animal de sua cidade. Se tem uma coisa que não tem preço, é o amor que um bicho desses é capaz de dar.