Quisera Eu
 
 Quisera ter nas mãos o dom da poesia e fazer simples palavras expressarem som. Ecoando em corações apaixonados, sonhar um futuro sem desilusões e fantasias, na certeza que um dia tudo seja eterno e que a palavra amor não seja desperdiçada na vida daquele que durma. Exprimir ternura em olhares, traduzindo encontro de abraços, inflamando desejos absortos e consumando figuradamente o amor.
 
 Quem dera ter a paciência do artista de rua, cotidianamente exibindo-se à um público desatento, apressado, outrora imaginário, mesmo assim apresenta-se; contando que o sorriso de criança lhe fará ganhar o dia e dando a esperança que amanhã seja melhor que ontem e hoje.
 
 Ah se pudesse comover minha platéia, assim como o ator extrai de seu público o que há de melhor no seu humor, sorrir, chorar, refletir e imaginar. Sim, pois não, imaginar e experimentar possibilidades. E por alguns instantes esquecer que a vida amarga como fel e, por vezes, torna-se dolorosa. Levando no palco a impressão da amnésia interina, fazendo-se sentir “ser humano”. Aplaudir... Lavar a alma.
 
 Pudesse ter a voz de um cantador na melodia e “sinfonia de pardais”, apaziguando ânimos e relaxando pensamentos. Em sua música aguçar todos os sentidos corporais homeopaticamente, adstringindo prazer e dor. A cada estrofe mitigar a conjunção perfeita de tons, sons e semitons em paráfrases aos acasos de destinos, inseguros, incertos e irreais.
 
 Tivesse a sabedoria de um senil em fazer escolhas com prudência e consciência, vislumbrando tudo e todos ao meu redor. Poder calcular alguns passos, saltar de banda ou mesmo voltar atrás. Pronto em ouvir tardio ao falar, alicerçando avenidas em estradas importunamente sinuosas. Aos tropeços uma lição, às dificuldades há solução e a teimosia existe o tempo... Cruel... Surreal... Imediato.
 
 Quisera ter a inocência de criança e olhar tudo e todos indiferente, não fazer acepção do que seja certo ou errado, também não ser penalizado pelas conseqüências de seus atos. Ao ser repreendido ter o “dom” e a humildade em aprender, buscando o novo, o desconhecido, o inédito. Passar pela vida sem que ela passe por nós, aproveitar cada manhã refreando a tarde e dormir tranqüilo, sabendo que o amanhã “Deus proverá”.
 
 Como não sendo senil menino, impedido em ser poeta, artista, ator ou cantador, levanto mais este dia sabendo que esteja fragilizado, propenso e intento em errar. Ciente que alheio a tudo isso está o tempo, imparcialmente observador e aguardando o tempo determinado para todas as coisas.
  
 Restando-me espetáculos teatrais, inconseqüente inocência na espera que um dia possa envelhecer cantando debaixo de um chuveiro, certamente depois que tudo isso aconteça, ainda haverá poesia. Quisera no futuro entardecer dos meus dias que não seja de tudo infeliz.

Samuel Moraes
04/05/2009
Sidrônio Moraes
Enviado por Sidrônio Moraes em 04/05/2009
Reeditado em 17/05/2015
Código do texto: T1575840
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