O Amor é Sofredor
Foi num presídio onde pude descobrir que o amor não tem limite. Não me refiro ao tipo de amor que é propagado aos quatro cantos. Um amor que acaba quando o outro não corresponde àquilo que é esperado ou quando o dominado rompe com as amarras.
Falo do amor que sofre, espera e confia. Do amor que tem uma capacidade de doação sem limite.
Num dia de domingo, sol causticante, numa fila quilométrica; deparei-me com uma anciã de oitenta e sete anos. Essa senhora de quinze e quinze dias fazia uma longa viagem para visitar seu neto que cumpria pena por homicídio.
Nordestina de pés e mãos marcados pelo trabalho na enxada e terra seca, ao perceber que diante dela estava uma ouvinte curiosa, começou no seu linguajar arrastado a contar sua história.
Dois dias antes de viajar ela saia pedindo ajuda para pagar o frete do carro. Do salário mínimo tirava uma quantia para levar para seu neto umas ¨ coisinhas que meu minino pricisa¨: bolacha, biscoito, sabonete, sabão em pedra, e outras mais que o ajudariam a passar seus longos dias por trás das grades.
Seu neto - fiquei sabendo por outra pessoa - matara a sangue frio um homem, colega de trabalho. E o que fora morto deixara mulher e filhos desamparados. Mas àquela avó quando se referia ao neto dizia:
- Meu netu, aquele que caiu naquele fracassu, eli tá pricisando de umas coisinhas, ieu pricisu vim visitá o coitadu. Nem culchão tem! A sinhora num tem nada pra mim dá, pra ieu levá pra meu mininu?
Percebi que essa avó não media esforços para chegar até esse ser que era a razão da sua vida.
Quando soube que eu estava passando uns dias na mesma cidade que ela morava, passou a ir à minha casa pedir revistas, como eu sei que ela é analfabeta, fui perguntar para quem ela estava pedindo aquele material. E mais uma vez me surpreendi com sua resposta:
- Uso pra papé de si limpá quandi vou pru banheiru, e comu lá em casa o pessoá é um entra e sai... intonse eu colocu as fôias pra ieles se limpá também.
Amor sofredor.
Ela levou uma queda, cortou o braço, precisou levar vários pontos. Ficou mais de duas semanas em repouso completo, pois um ombro precisara ficar imobilizado, mas quando chegou o dia de ir visitar o neto, aquela anciã enfrentou uma viagem de quatro horas numa Toyota, sem nenhum conforto, passando até privação; pra ela pouco importava se sofria ou não,o que almejava seu coração era vê e abraçar seu ¨mimino¨que naquele lugar infernal estava à sua espera.
Atualmente está em cima de uma cama, as pernas perderam as forças, está recebendo ajuda já que passou a maior parte de sua vida sendo doadora. Mas o tempo passa, e vai deixando sua marca. A idade e os dissabores estão cobrando seu preço, porém seu amor fala mais alto. Só pensa no seu ¨minino que caiu nessa fraqueza de vida¨.