Éramos três...
Falava com fluência à proporção que ouvia o rumorejar de gente andando pela rua. Apoiava-se no braço de Anita. Tinha um fraco por Anita. Quando viu Anísio procurou entrar na confeitaria. Os seus olhos azuis se fixaram nele para que saísse à voz conhecida do amor consumado. Anísio estava melindrado naquela esquina entre três situações simultâneas: Pereira havia solicitado a bicicleta para tarefa de farmácia. Com Cerqueira havia comprado um suíno em sociedade, e ele seguia procrastinando o prazo do sacrifício. Permanecia sem entender as desviadas do sócio no porco. - Ainda é cedo. Há que se engordar mais o bicho -. Soava-lhe evasivo porque havia passado pelo chiqueiro para conferir o tamanho do animal. De modo que o porco estava volumoso na lama. Coberto de moscas e grunhidos. Abisso de sono, pronto para o espeto. A bicicleta havia desaparecido nas mãos do Pereira. Se não aparecesse ficaria em casa exposto a luz enfermiça do dia. De forma que o sol se vestia de duvida e a pequena tragédia se consumava. Após o café havia extraviado vinte reais pela casa. Depois do almoço reencontrou o dinheiro para que fosse roubado na Casa de Loteria. Valor que havia perdido e achado. Suprimido pelas mãos ágeis e desgraçadas de marmanjo punguista. Agora era apenas um homem na esquina sob os olhares de um amor acabado na Confeitaria Luso. Um homem na esquina, excepcionalmente, voando enganos... -Ah, Madalena de braços dados com Anita dentro da Confeitaria Luso -. No início estava lendo “coisas” no escritório quando topou com aquele olhar azul. O colo moreno na roupa branca acendeu-lhe a tentação irreprimível. Sempre no escritório Madalena olhava o seu todo de andorinha em meio a ataques de risinhos. Seguia fabricando amor da alegria. Tipo de afeto oriundo de coloridos refúgios, perfeito estilo pronto para transformar eventos bucólicos em odisséia. O coração avelhantado longamente enternecido suspirava de leve. Mas na esquina da amargura fez o possível para permanecer oculto no Bar Caramuru. Chegou a escutar a frase que escapou dos lábios de Madalena entre transeuntes de todos os rumos: já é mulher formada... Formada em biologia. – Pronunciava Madalena à proporção dos passos. Anita apenas ouvia admirando o lombo das nuvens. Logo ambas estavam em pose de confeitaria. Retas entre quindins amarelos dispostos em pratinhos de alvura impecável. Falavam e sorriam como se a felicidade habitasse o mini-hotel das suas vidas. Fortuna multifiel que aderia parte da existência mesmo a certa distância. Faltava apenas à bicicleta surgir na tração das pernas de Pereira, além de Cerqueira com a data do assado. Foi o que aconteceu como o sol. Num piscar de olhos todo aborrecimento desapareceu, menos um.
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