GARRINCHA E NILTON SANTOS

A GRANDEZA DE NILTON SANTOS

Nelson Marzullo Tangerini

Nilton Santos, bicampeão pelo Botafogo e [mundial] pela Seleção Brasileira, dizia, com orgulho, que havia levado um baile de Garrincha, “o Demônio das pernas tortas”, em pleno campo da Rua General Severiano, quando o menino do interior do Estado do Rio de Janeiro, mais precisamente de Pau Grande, apareceu em Botafogo para mostrar seu futebol.

“A Enciclopédia do futebol”, como Nilton Santos era conhecido, criou até, na época, um neologismo: “o João”. E muitas vezes vi o maior lateral esquerdo de todos os tempos dizer, com orgulho, que havia sido o primeiro “João” de Mané Garrincha. Ao presidente do Botafogo, o lateral teria dito: “Contrata esse sujeito, porque não quero que ele jogue contra mim”.

Uma atitude de caráter, de respeito ao próximo. Mais tarde, Nilton Santos e Garrincha seriam grandes amigos.

Quando o arrogante lateral Juan, do Flamengo, agride o jogador Maiconsuel, do Botafogo, após tomar uma série de dribles desconcertantes em pleno Maracanã lotado, o rubro-negro quer dizer que ele, um jogador do clube mais protegido pela CBF e pelo Tribunal Desportivo, o mais querido da mídia, não pode ser desmoralizado num clássico do futebol brasileiro.

Assistia ao jogo pela televisão, e fiquei tentando escutar o que Juan lhe dizia com tanta raiva, com tanta autoridade, com o dedo apontado para a cabeça do alvinegro:

“- Já viu as cores da minha camisa?”, “- Sabe em que clube eu jogo?”, ou melhor, “- Sabe com quem está falando?”. Porque hoje vivemos dentro de uma ditadura, a ditadura da mídia flamenguista, porque o Rio de Janeiro hoje é um feudo do Clube de Regatas do Flamengo. Pênalti, só a favor do Flamengo; contra o Flamengo ninguém marca. E os torcedores de todos os clubes sabem disto.

Há três anos O Glorioso tenta ser campeão e não deixam. Quem manda O Clube da Estrela Solitária não ser o queridinho da mídia. É de praxe: em todo jogo Botafogo x Flamengo a história se repete: quando um jogador alvinegro não é expulso, o juiz marca pênalti contra o Botafogo. E se o Clube de General Severiano estiver vencendo, o time da Gávea arruma uma confusão em campo para tumultuar a partida e se favorecer disto. Torcedores de Vasco da Gama, Fluminense e América também já perceberam isto, mas a fórmula continua sendo usada. E é infalível.

Alguns colunistas hão de dizer que somos chorões, que vivemos reclamando, que não vamos aos estádios porque não acreditamos no time. Mas tudo isto é conversa fiada de torcedor do Flamengo com carteirinha de jornalista. Todos nós sabemos que o Botafogo é o clube mais garfado da história do futebol brasileiro. Somos garfados porque temos uma história. Rola uma inveja por trás de tudo isto. Não vamos mais aos estádios porque sabemos que não adianta termos um bom time e que O Glorioso vai ser garfado. Vimos este filme em 2007, quando Djalma Beltrami anulou um gol legítimo de Dodô e ainda expulsou o jogador de campo. Depois, Beltrami ficou falando pelos cantos e pelos cotovelos que estava muito triste, deprimido, por ter prejudicado o Botafogo. Enquanto toda a mídia comemorava o título, a Tribuna da Imprensa, mais honesta, questionava o campeonato de 2007, dando ênfase ao erro do juiz.

Sabemos que, mesmo tendo um bom time, não vamos ganhar nada. Não vão deixar o Botafogo ser campeão.

No Brasil - já sabemos -, o crime compensa. No final, os desprotegidos aplaudem o bandido, o Robin Hood da comunidade carente.

A arrogante e intolerante torcida rubro-negra vai ao estádio porque sabe que o clube vai ser ajudado; cantam a vitória antes do jogo porque têm a certeza da impunidade. E a mídia aplaude porque vai faturar em audiência e venda de jornais e revistas.

No final, tudo acaba em festa – ou em pizza. Estamos no Brasil.

Aos botafoguenses, só resta, então, ficar lembrando daqueles grandes ídolos do passado, daqueles 97 jogadores que vestiram a camisa da Seleção Brasileira. Daqueles, 46 foram campeões mundiais pelo Brasil em Copa do Mundo ou em outros torneios. Isto faz a diferença.

Quando João Saldanha disse que a torcida do Botafogo não era pequena, que era, sim, selecionada, o velho e bom João queria nos dizer que éramos finos, educados e responsáveis pelo tricampeonato mundial. A metáfora nos salvará.

O Botafogo é Patrimônio da Humanidade. Isto é uma realidade. Essa mídia alienante que deleta homens e clubes não pode mudar fatos históricos. A nossa história foi escrita com estrelas, suor, lágrimas, sorrisos, dribles, gols, alegrias, manchetes internacionais e não pode ser contestada. Ninguém vai apagar a Estrela Solitária.

E viva a humildade de Nilton Santos, o João do Mané Garrincha!

Nelson Marzullo Tangerini, 54 anos, é escritor, jornalista, poeta, compositor, fotógrafo e professor de Língua Portuguesa e Literatura. É membro do Clube dos Escritores, onde ocupa a Cadeira 073 – Nestor Tangerini.

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Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 29/04/2009
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