Desencontros

Começou como um namoro criança. Namoro de criança, todo mundo sabe, é aquele em que não precisa “pedir em namoro”, paquerar ou conquistar a pessoa para namorá-la. É só escolher o namoradinho ou a namoradinha e pronto.

Pode até contar para algum coleguinha que você já tem namorada. Mas precisa ser em segredo, porque se ela souber, pode ser que termine com você. Esse é o namorinho das crianças da época em que eu fui criança (pra não dizer “da minha época”, não sou tão velho assim...). Hoje os namorinhos de crianças são bem diferentes, mais modernos, mais liberais.

Tive várias namoradas assim. Neste ponto, acho que minha infância durou mais do que deveria. Elas não me davam bola, mas também não me cortavam. Talvez justamente porque nem sonhavam que eram minhas namoradas.

Teve uma dessas namoradinhas que foi, digamos, “diferente”. Era a que eu menos via. A distância entre as nossas cidades era mais de 100 quilômetros. Nos víamos nas raras ocasiões em que haviam reuniões da Gakkai em que reuniam membros de toda a região de São José do Rio Preto. Ainda assim, não eram todas que ela ia. Era muito raro encontrá-la mesmo.

Passávamos meses e meses sem nos ver, sem ter notícias um do outro. E esses escassos encontros eram tão rápidos, tão curtos, que quando iam além de um cumprimento, era motivo de comemoração.

Éramos muito novos para qualquer tipo de relacionamento. Eu ouvia algumas histórias da família dela, dizendo que eram muito tradicionais. Me dava medo...

Além disso, eu era tão tímido e inseguro, que seria incapaz de até mesmo insinuar alguma intenção. Sem outra alternativa, guardava todos os sentimentos bem lá no fundo de mim, e torcia para que ela demonstrasse algo que sustentasse minha esperança.

Quando eu ouvia terceiros tecendo comentários sobre um possível namoro dali a muitos e muitos anos, eu me alegrava muito. “Talvez tais comentários tenham chegado a ela também!”, torcia.

Ela tinha (e ainda tem!) inúmeras qualidades que despertam atenção, interesse e outros tantos instintos masculinos mais.

Creio que a primeira oportunidade que tivemos de conversar um pouco mais foi quando houve um importante evento musical na sua cidade. Durante os preparativos da atividade, enquanto esperávamos os músicos chegarem de São Paulo, tivemos a oportunidade de nos conhecer mais.

Assim o tempo foi passando, com um contato aqui outro ali e cada um foi seguindo o seu rumo, cada vez mais divergente.

Me doeu muito quando eu a vi com o namorado. Todas as esperanças em relação ao futuro foram instantaneamente despedaçadas. Entretanto, sei também que ela ficou incomodada com pessoas com quem fiquei. Chumbo trocado involuntariamente.

Mais um bom tempo e ambos mudamos de cidade, a trabalho ou a estudo. Ficamos então anos e anos sem notícias um do outro.

Num belo dia, recebo o seu telefonema como quem não quer nada. Colocamos boa parte dos assuntos em dia, até que tema da prosa converge para um possível encontro. Era algo fatalmente inevitável, mistura de curiosidade e pendência sentimental.

Combinamos o dia e o local. O ato foi consumado. As dúvidas, sanadas. Todos os assuntos, dialogados abertamente.

Foi o desfecho de uma história de amor não vivida. Apenas um único e decisivo encontro. Não era mesmo para ficarmos juntos. Agora, depois de tantos anos, ambos entendemos os reais motivos. Recentemente voltamos a ter contato por msn e nos demos conta do quanto nossas vidas seguiram direções completamente incompatíveis.

(Catalão, 25/04/2009)

Hélio Fuchigami
Enviado por Hélio Fuchigami em 25/04/2009
Reeditado em 26/04/2009
Código do texto: T1559617
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