Poder Ineficaz

O Brasil jogou com o Equador no dia 29/03/2009, no Rio, às 18h. O resultado foi 1 a 1. Pouco antes disso a principal rede de televisão carioca começara a anunciar um furo de reportagem para o seu principal programa jornalístico (também) de domingo. Tratava-se de um crime ao vivo cometido entre presidiários dentro de uma penitenciária. A notícia só foi ao ar por volta de 22h, após ter sido exaustivamente anunciada ao longo da programação da emissora.

No dia seguinte, 30/03, uma moça de religião evangélica foi assassinada na frente dos pais numa tentativa de assalto à saída do metrô.

Também nesse dia tivemos a notícia de que uma autoridade (não sei se do Governo Federal), provavelmente valendo-se do seu mandato eletivo, pagava a sua empregada doméstica como se ela fosse funcionária da Assembléia Legislativa.

Hoje (22/04/2009), quase fins de abril, deparamo-nos com mais um caso de assassinato de uma jovem – grávida (felizmente o bebê foi salvo) – numa tentativa de assalto no Jacarezinho. Assim como somos levados ao conhecimento da farra das passagens aéreas que, a partir de agora, os políticos vão ter o direito de estender a familiares ou terceiros, independentemente de terem ou não as viagens relação com as funções exercidas por esses (des) representantes do povo.

Aparentemente tratam-se as situações referidas de casos isolados. Mas não será necessário olharmos com mais atenção para percebermos o traço marcante que as une. E que se relaciona à presença ineficaz, omissa ou inexistente do Estado.

No primeiro caso, consideramos lícito imaginar que deveria caber ao Estado a garantia da integridade física dos seus prisioneiros. Como isso não acontece, temos em decorrência a exploração sensacionalista de uma ação que, antes de representar a denúncia de um ato falho, atende às preocupações da rede de televisão quanto à manutenção ou aumento dos seus níveis de audiência. Se assim não fosse, não haveria porque manter o expectador preso à telinha até à hora de ser liberada a reportagem.

No caso dos assassinatos das jovens, como muitos outros de que nada ficamos sabendo, podemos atribuí-los à total insegurança urbana que se verifica nas ruas do Rio de Janeiro. Insegurança que vem crescendo ao longo dos últimos 40 anos.

Os prédios, que antes tinham o acesso livre até à recepção, agora são cercados por grades e equipados com porteiro eletrônico, câmaras, circuito interno de vídeo, etc. As ruas, sobretudo nos subúrbios, tornam-se praticamente desertas a partir das 20h. E muitas, em vários bairros, são dotadas de grades ou cancelas, com a instalação de guaritas, para a restrição ao tráfego de veículos que não sejam de moradores.

É significativo o aumento do número de assaltos à mão armada, seguidos ou não de óbitos, que permanecem sem esclarecimento. Também aqui fica clara a ineficácia do Estado. Que deveria ter maior atuação na prevenção dessas ações criminosas através de um policiamento mais efetivo e atuante, através da revisão das penas de encarceramento, cujo rigor maior poderia servir de exemplo, e finalmente através de uma política de redução dos níveis de desequilíbrio financeiro entre as camadas sociais.

Quanto ao caso da malversação dos recursos públicos, que outros responsáveis poderiam ser apontados em lugar das pessoas com autoridade nos sistemas de governo municipal, estadual ou federal? Autoridade sempre concedida, no caso dos políticos, pelos seus eleitores. Novamente nos parece clara a identificação da impotência do Estado.

Mas quem são as pessoas que administram o Estado, diriam alguns, senão o próprio povo? Não são os governantes, ou os integrantes de qualquer sistema governamental, pessoas oriundas das diferentes camadas populares? Afinal, os governantes não são máquinas ou robôs. São também de carne e osso.

Só que essas pessoas, gente como a gente, uma vez conduzidas aos centros de poder, não têm a coragem de promover no sistema as alterações que a sociedade deseja. Sob a alegação de que é muito difícil, senão impossível ou impraticável, realizar o que o povo quer.

As alterações não podem ser profundas porque – e isso, é claro, sempre nos é omitido – a realização do desejo do povo coloca-se contra os interesses de quem está eventualmente no poder. Então as pessoas no poder, apesar de carne e osso, pouco ou nada têm a ver com as camadas sociais de onde se originaram.

Dessa forma, quanto maior a eficácia do poder, maior também a ineficácia do Estado. Será preciso assim desentronizarmos o poder, retirarmos grande parte da sua eficácia para que através dela ele não acabe manipulando as pessoas do povo que lhe tenham acesso. Através do voto ou através de indicações de outros poderosos. Tornando maior a condição de essas pessoas representarem não os próprios interesses, mas os daqueles que por elas são representados.

Rio, 22/04/2009

Aluizio Rezende
Enviado por Aluizio Rezende em 23/04/2009
Reeditado em 23/04/2009
Código do texto: T1554455
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