REFLEXÕES SOBRE A MORTE
Nesta última quarta-feira tive o desprazer de ir ao velório de minha tia. Esta faleceu aos 48 anos de idade, vítima de um câncer no pâncreas, contra o qual já estava em luta há quase três anos.
Fazia um bom tempo que eu não a via. Quando a vi no caixão tive a impressão de que não era a pessoa que eu conhecia. A doença havia simplesmente acabado com aquela mulher. Uma moça que fora muito bonita e extremamente divertida.
Mas já foi dito por um brasileiro de marca maior que o ofício do câncer é este, ou seja, acabar com o indíviduo, não se importando se este era virtuoso ou não. Forte o realismo machadiano, contudo o nome do movimento literário que este faz parte já dizia a que veio.
Esta minha tia era evangélica, frequentava uma igreja Batista, e seu velório foi realizado nesta. Nunca antes eu havia visto um velório evangélico. Percebi a ausência daquele horrível crucifixo de aço, do horrendo cheiro de velas e das deprimentes rezas católicas. Digo deprimentes, pois evidentemente não estamos numa ocasião propriamente agradável, se começam a cantar músicas com grande carga dramática, certamente o nosso estado emocional ficará ainda mais abalado. Pelos menos eu fico assim.
Em minha visão o velório evangélico tem uma aparência mais “clean”, menos pesada, menos dramática, menos impactante. Fiquei impressionado, pois havia uma senhora que tocava piano o tempo todo, inclusive dedilhava melodias alegres.
Levei minha filha para que tivesse sua primeira experiência de ver alguém morto. Para que a pequena (09 anos) começasse a ver um pouco da realidade iminente. Iminente por quê? Porque ao ver minha tia no seu caixão foi como se eu tivesse visto a mim mesmo. Como se todo aquele espetáculo da morte fosse meu. O que certamente será um dia, quiçá muito distante deste ano de 2009, mas que inevitavelmente virá. O detalhe é somente uma questão temporal.
Neste dia foram tantas as reflexões que me vieram à mente que eu poderia escrever inúmeros artigos sobre isso. Pensei principalmente que a morte do outro nos faz refletir sobre a nossa, que as pequenices diárias que praticamos, a arrogância, a falta de amor e respeito pelo ser humano são os maiores males. Por que insistimos em nos comportar de maneira tão mesquinha? Talvez pensemos que somos imunes à morte, que esta acontece somente com os outros, não conosco.
Ao ver minha tia no caixão senti-me fraco, frágil e que num piscar de olhos serei eu que estarei naquela posição. Vi meus parentes que não via há muito tempo, vi meu irmão que não via também com frequência, fiquei feliz por vê-los, por abraçá-los e beija-los. Reavaliei alguns valores e acho que este evento me abalou bastante.
Contudo o abalo foi para o bem, no sentido de tentar ser menos arrogante e valorizar mais as pessoas sem distinção, pois ninguém é bom ou mau. As pessoas praticam o bem ou praticam o mal e isto não é sua essência. Todos, sem exceção, temos potencial tanto para o bem quanto para o mal, isto é questão de escolha. Junto a isso, começo a perceber que a religião, apesar de tudo, quando minimiza os sofrimentos das pessoas é de grande valia.
Lembrei-me do Dr Drauzio Varela, que numa percepção genial disse em um de seus livros que o médico não é necessariamente aquele que cura, mas aquele que consegue minimizar o sofrimento. Se pudermos minimizar nossos sofrimentos e ajudar os outros nesta empreitada, também seremos médicos. Médicos da alma, nesta vida que pode ser bem melhor aproveitada.