A Primeira

A primeira experiência é muito marcante. Dela guardamos um colorido todo especial.

Não é sem razão que um fabricante de porta-seios tinha como propaganda: “o primeiro sutiã a gente nunca esquece”.

Realmente, quem consegue esquecer a primeira vez que o filho abandonou o “gatinhar”, para dar os seus primeiros passos? Quem não recorda do seu primeiro beijo, do primeiro amor, da “primeira”, do primeiro emprego e de tantas outras experiências realizadas pela primeira vez?

Era janeiro de 1979. Aquele jovem senhor, nos seus 39 anos, jamais imaginara que fosse capaz. Guardava um sentimento de que não conseguiria fazê-lo. Em sua imaginação passava que, caso o fizesse, o resultado não seria bem recebido.

Paulão e o jovem senhor eram companheiros de trabalho.

Paulão era adolescente, tinha sido criado pela avó, da qual herdara a vocação para música. Trabalhava como contínuo, enquanto o “coroa”, como era tratado por seus colegas de trabalho, era o que poderíamos titular de “analfabeto musical”.

A natureza havia sido benevolente com Paulão. Era do tipo “bem apanhado” e com uma comunicação fácil e envolvente. Além disso, o coroa havia reconhecido nele um grande potencial e o estimulara a voltar a estudar. Já havia vencido o supletivo e agora estava se preparando para fazer vestibular para Administração.

Em 1976, um grupo de empregados havia criado o bloco carnavalesco “Bloco do Tatu”.

Em pouco tempo foi implantado um evento pré-carnavalesco, no qual vários empregados apresentavam seus sambas, para que uma comissão julgadora escolhesse o vencedor.

Para o carnaval daquele ano, Paulão decidira concorrer. Confiava nos seus dotes musicais, mas precisava de um parceiro para fazer a letra.

Foram a sensibilidade, a paciência, a persistência e um sentimento de gratidão de Paulão que conseguiram convencer o coroa a encarar o seu primeiro concurso de sambas para um carnaval.

O coroa associou, de forma cartesiana, o carnaval ao “Bloco do Tatu”, criou as “primeiras rimas” e apresentou-as ao Paulão.

Paulão, sentindo-se como o parteiro daquele “quase letrista”, após uma rápida leitura das rimas, comentou: é preciso algumas pequenas alterações. Samba de carnaval, para ter chance de vencer, precisa ser temperado com pitadas de sacanagem.

Assim Paulão, tornava-se parteiro do seu próprio parceiro. Nasciam: mais um “fazedor de rimas” e o samba “Saudando o Bloco do Tatu”.

Saudando o Bloco do Tatu

Existe um tatu apavorado,

entocado de março a janeiro.

Sabem onde, senhores?

Dentro do seu buraco.

Quando chega fevereiro,

esquece seus temores.

No compasso do pandeiro

e na esperança de amores

surge com graça e vida;

sabem de onde, senhores?

Do seu buraco para avenida.

Mas como todo tatu

o bom cabrito imita,

não chia e cai na folia

até as cinzas da quarta-feira.

Adeus, adeus aos amores,

até o próximo fevereiro.

no sincopado do pandeiro.

Lá vem o tatu de volta

Vem alegre e suado;

sabem para onde, senhores?

Da avenida para o seu buraco,

Da avenida para o seu buraco.

J Coelho
Enviado por J Coelho em 16/04/2009
Reeditado em 18/03/2021
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