DE MANIAS E LOUCURAS – PARTE FINAL
"Nada na vida é em vão". Sinceramente, eu não sei de quem é esta frase, por isso mesmo não darei o merecido crédito. Portanto, partindo desta premissa, a minha viagem teve um motivo que, se não serviu (eu acho que serviu) para o momento, com certeza servirá para o meu futuro.
Consciente de que meu parceiro realmente era cheio de manias, à noite, quando voltei para a casa do professor, eu acessei a net e fui procurar saber mais sobre o que era, de verdade, o sentido desta palavrinha. Revelo que o conceito me trouxe de volta aquela sensação de arrepio que sempre tenho quando percebo que algo não está bem.
Porém, como todo bom brasileiro, eu optei por definir “mania” pela sua concepção vulgar que ameniza um pouco o conceito científico e diz apenas que são alguns hábitos ou costumes, caracterizados por uma fixação ou repetição exagerada, como por exemplo, de gestos.
Assim, naquela noite de quarta, depois do jantar, eu fiquei sabendo que farmacomania é a mania que o individuo tem de tomar remédios e, pior, de indicá-los para outrem. Isso me ajudou a compreender os diálogos inflamados da professora que estava realizando exames médicos e do meu companheiro, quando os dois indicavam – cada um no seu momento - remédios de princípios ativos que eram verdadeiros milagres fitoterápicos.
Maravilha, pensei. Além dos remédios de ‘marca’ e seus genéricos, os dois sabiam tudo sobre o tratamento de doenças através do uso de plantas.
Por volta das onze da noite, nós nos recolhemos. Como de costume, eu fiquei observando-o para não perder nenhum detalhe de suas esquisitices. O copo com água, transbordando (não sem antes ter tomado as pílulas capsuliformes – duas, por sinal), não deixou de ser levado. Por precaução, eu aproveitei e enchi um para mim. Vai que eu, sem querer, precisasse de alguma coisa...
Uma hora da manhã, sono bom, quarto em harmonia com o silêncio e a brisa que entrava pela janela aberta, eu acordei, aos poucos, porque, em meu estado letárgico do bem, uma manifestação verbal se fazia ouvir, insistentemente, em meus ouvidos. Não estranhei, nem me assustei e nem fiquei em posição de sentido quando abri os olhos e vi, em pé – entre a minha cama e a dele – o meu parceiro de quarto.
- Diga homem! Perguntei calmamente sem me sobressaltar – estava acostumado, confesso.
- Raimundo, eu estou com aquela sensação de fome. Vamos, comigo, comprar nem que seja um sanduíche!
- Calma! Isso tudo não passa de mania, rapaz. Controle-se.
Apesar de tentar convencê-lo de que era uma compulsão, quando percebi que ele estava começando a suar, eu imediatamente me vesti, acordei o recepcionista da noite, tirei o carro da garagem da casa, e lá fomos nós comprar comida em plena madrugada. Sabem daqueles pastéis gigantes que servem para uma família inteira? Ele comeu um. E bebeu um refrigerante de 600 ml. Eu olhando. Ali, naquele momento, ele era o cara mais feliz do mundo. E o mais sadio também.
Na volta, ele deu outra passada na cozinha da casa e levou mais um copo cheio d’água. Eu levei outro. O que eu tinha levado - e não havia tomado -, estava quente. E talvez não fosse bom tomar alguma coisa, de madrugada, com água neste estado.
Finalmente o dia amanheceu, tudo se repetiu, o exército de capsulazinhas coloridinhas foram, aos poucos, sendo engolidas e o dia transcorreu normal. Claro que tomei as devidas precauções, como, por exemplo, me sentar à direita do dito cujo. E assim como o dia, a noite não teve nada fora da rotina: a tradicional conversa sobre doenças e remédios, o copo com água, as bolachas recheadas para quando acordasse com fome, etc.
Finalmente a sexta feira! Quando o curso terminou e nós estávamos voltando para a hospedaria, eu propus ao digníssimo que ele viajasse para a sua casa, naquela noite mesmo, e eu seguisse viagem para a capital da Paraíba, para visitar e passar o fim de semana com a minha filha.
- Professor, eu não viajo à noite, em ônibus, de jeito nenhum! Tenho medo de assalto, de um acidente e de olhar pela janela e ver somente o escuro da boca da noite.
Incrível! Mesmo já acostumado com as excentricidades do colega, a cada nova mania, eu ficava perplexo.
Sem ter o que fazer, o jeito foi pernoitar na Capital do Sol e só viajar na manhã seguinte.
A noite de despedidas foi especial. Eu fiquei de olhos e ouvidos na conversa entre os hipocondríacos e vi quando os dois, além de trocarem os últimos conhecimentos e novidades na área farmacêutica, e de alertarem um ao outro, sobre as prováveis doenças que eles poderiam – ainda – ter, esses olhos que a terra há de comer, viram quando eles trocaram remédios! Sim. Isso mesmo. Na despedida, antes de irem dormir, os nosomaníacos – como gentilezas – trocaram as capsulazinhas coloridinhas, tão bonitinhas parecidinhas com aqueles dropezinhos gostosinhos de comer e foram dormir felizes como dois anjinhos...
"Nada na vida é em vão". Sinceramente, eu não sei de quem é esta frase, por isso mesmo não darei o merecido crédito. Portanto, partindo desta premissa, a minha viagem teve um motivo que, se não serviu (eu acho que serviu) para o momento, com certeza servirá para o meu futuro.
Consciente de que meu parceiro realmente era cheio de manias, à noite, quando voltei para a casa do professor, eu acessei a net e fui procurar saber mais sobre o que era, de verdade, o sentido desta palavrinha. Revelo que o conceito me trouxe de volta aquela sensação de arrepio que sempre tenho quando percebo que algo não está bem.
Porém, como todo bom brasileiro, eu optei por definir “mania” pela sua concepção vulgar que ameniza um pouco o conceito científico e diz apenas que são alguns hábitos ou costumes, caracterizados por uma fixação ou repetição exagerada, como por exemplo, de gestos.
Assim, naquela noite de quarta, depois do jantar, eu fiquei sabendo que farmacomania é a mania que o individuo tem de tomar remédios e, pior, de indicá-los para outrem. Isso me ajudou a compreender os diálogos inflamados da professora que estava realizando exames médicos e do meu companheiro, quando os dois indicavam – cada um no seu momento - remédios de princípios ativos que eram verdadeiros milagres fitoterápicos.
Maravilha, pensei. Além dos remédios de ‘marca’ e seus genéricos, os dois sabiam tudo sobre o tratamento de doenças através do uso de plantas.
Por volta das onze da noite, nós nos recolhemos. Como de costume, eu fiquei observando-o para não perder nenhum detalhe de suas esquisitices. O copo com água, transbordando (não sem antes ter tomado as pílulas capsuliformes – duas, por sinal), não deixou de ser levado. Por precaução, eu aproveitei e enchi um para mim. Vai que eu, sem querer, precisasse de alguma coisa...
Uma hora da manhã, sono bom, quarto em harmonia com o silêncio e a brisa que entrava pela janela aberta, eu acordei, aos poucos, porque, em meu estado letárgico do bem, uma manifestação verbal se fazia ouvir, insistentemente, em meus ouvidos. Não estranhei, nem me assustei e nem fiquei em posição de sentido quando abri os olhos e vi, em pé – entre a minha cama e a dele – o meu parceiro de quarto.
- Diga homem! Perguntei calmamente sem me sobressaltar – estava acostumado, confesso.
- Raimundo, eu estou com aquela sensação de fome. Vamos, comigo, comprar nem que seja um sanduíche!
- Calma! Isso tudo não passa de mania, rapaz. Controle-se.
Apesar de tentar convencê-lo de que era uma compulsão, quando percebi que ele estava começando a suar, eu imediatamente me vesti, acordei o recepcionista da noite, tirei o carro da garagem da casa, e lá fomos nós comprar comida em plena madrugada. Sabem daqueles pastéis gigantes que servem para uma família inteira? Ele comeu um. E bebeu um refrigerante de 600 ml. Eu olhando. Ali, naquele momento, ele era o cara mais feliz do mundo. E o mais sadio também.
Na volta, ele deu outra passada na cozinha da casa e levou mais um copo cheio d’água. Eu levei outro. O que eu tinha levado - e não havia tomado -, estava quente. E talvez não fosse bom tomar alguma coisa, de madrugada, com água neste estado.
Finalmente o dia amanheceu, tudo se repetiu, o exército de capsulazinhas coloridinhas foram, aos poucos, sendo engolidas e o dia transcorreu normal. Claro que tomei as devidas precauções, como, por exemplo, me sentar à direita do dito cujo. E assim como o dia, a noite não teve nada fora da rotina: a tradicional conversa sobre doenças e remédios, o copo com água, as bolachas recheadas para quando acordasse com fome, etc.
Finalmente a sexta feira! Quando o curso terminou e nós estávamos voltando para a hospedaria, eu propus ao digníssimo que ele viajasse para a sua casa, naquela noite mesmo, e eu seguisse viagem para a capital da Paraíba, para visitar e passar o fim de semana com a minha filha.
- Professor, eu não viajo à noite, em ônibus, de jeito nenhum! Tenho medo de assalto, de um acidente e de olhar pela janela e ver somente o escuro da boca da noite.
Incrível! Mesmo já acostumado com as excentricidades do colega, a cada nova mania, eu ficava perplexo.
Sem ter o que fazer, o jeito foi pernoitar na Capital do Sol e só viajar na manhã seguinte.
A noite de despedidas foi especial. Eu fiquei de olhos e ouvidos na conversa entre os hipocondríacos e vi quando os dois, além de trocarem os últimos conhecimentos e novidades na área farmacêutica, e de alertarem um ao outro, sobre as prováveis doenças que eles poderiam – ainda – ter, esses olhos que a terra há de comer, viram quando eles trocaram remédios! Sim. Isso mesmo. Na despedida, antes de irem dormir, os nosomaníacos – como gentilezas – trocaram as capsulazinhas coloridinhas, tão bonitinhas parecidinhas com aqueles dropezinhos gostosinhos de comer e foram dormir felizes como dois anjinhos...
Obs. Imagem da internet