OS DOIS

Dois.

Ele e ela.

Ele fala. Ela escuta com atenção invejável.

Agora ela fala, sorrindo. Ele se inclina como para beijá-la. Recua.

Não dá pra ouvir daqui. Observo-os apenas.

Ela, alva. Ele, pardo. Um belo espécime de casal.

Tocam-se nas mãos. Um sorriso mútuo.

Afastam-se olhando ao redor. Olhares perdidos, mas não de desinteresse. Olhares vigilantes.

Não estão sós, mas o metro quadrado que ocupam parece hermeticamente fechado.

Um ar de mistério e cumplicidade. Uma pontada de culpa.

De cá os invejo.

São jovens.

Beijam-se enfim.

Mãos dadas, saem da sala. Perdem-se na multidão.

O palácio ficou maior. Mais vazio. Talvez menos intenso. Mais chato com certeza.

Despeço-me do Rei com um abraço.

Entro no meu sedã sozinho.

Jogo o carro numa vala.

Morro afogado.

Os dois lerão amanhã no periódico.

Não se lembrarão de mim.