Um breve ensaio sobre o tempo

O tempo é um ente realmente fantástico. Pode, simultaneamente, ser a mais vulgar das vulgaridades e a mais nobre das nobrezas, ou então a mais mesquinha das mesquinharias durante anos para tornar-se a mais esperançosa das esperanças na próxima fração de segundo.

É o maior bode expiatório já registrado nos anais da história humana. Afinal, não fosse a alegada falta do mesmo a humanidade faria, por baixo, três vezes mais do que efetivamente faz. Que jogue a primeira pedra quem nunca reclamou da falta de tempo, mesmo sendo este sempre minuciosamente dividido entre todos de forma igualitária e preestabelecida: vinte e quatro horas por dia para cada um até o final dos tempos, se é que haverá um final. O tempo é, em sua essência política, de extrema esquerda.

Mesmo sem qualquer teste de DNA, desconfio ainda de certo parentesco entre o tempo e o acaso, que, aliás, nunca mais foi visto depois que decidiu aventurar-se como grileiro pelas bandas de Rio Branco, no Acre. Há até quem duvide de sua existência. Tanto do acaso quanto do estado do Acre.

O tempo é algo impossível de ser negociado, muito embora os companheiros de classe proletária não costumem aceitar muito bem este conceito, enquanto aguardam ansiosamente pelas dezoito horas, já imaginando o holerite do dia dez.

Afinal, fora eventuais distorções na geometria do espaço e do tempo causadas por certo alemão doidão, das quais não convém comentar por ora, o tempo, brilhantemente definido por Paulinho da Viola como um pássaro de natureza vaga, além de inegociável, é mensurável, líquido, certo, e personalíssimo.

Quem pensa que o aluga, aluga a si mesmo. Nada contra isso, claro, posto que eu mesmo esteja disponível para locação, dependendo basicamente duma questão de número de zeros. Só não estou aceitando contrato de leasing por ainda me restar certo amor-próprio. Mas aviso assim que acabar.

Uma das qualidades mais fantásticas do tempo é que se não há como ganhá-lo, certamente não há como perdê-lo.

E, haja vista que não há como perdê-lo, temo que seja tanto quanto estúpido preocupar-se com o mesmo.

Assim, sinceramente já não dou grande importância ao tempo, que também já não me presta o mesmo zelo de outrora.

Ainda relacionamo-nos, claro, já que não há outra possibilidade. Todavia fico na minha, e ele, até onde sei, fica na dele.

Suportamo-nos, enfim.

Só não sei até quando.

Herr Brehm
Enviado por Herr Brehm em 02/04/2009
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