CULPA
Estou usando um computador. Não tem muito tempo que caneta e papel faziam parte dos objetos sobre a minha mesa. Nunca fui organizado, alias, odiava quando alguém resolvia organizar o meu desorganizado espaço. Ninguém entendia que o lixo não era lixo. O errado era o certo e que uma caneta quebrada fluía muito mais criatividade do que uma vistosa caneta nova. Só porque ela teve as suas tampas jogadas entre mil bagulhos guardados, que não sei para que, porem imprescindíveis no dia de são nunca. Que nunca chegava. Sete anos e os libertarei desse abandono.
Lugar ideal para me livrar daquelas porcarias, antes mesmo que se tornassem úteis e sumissem por conta própria, já que ninguém iria assumir o ilícito. É certo que descarreguei nela toda a culpa pela minha indecisão criativa. Mordi e até mesmo provei. Confesso que tinha um gosto sem gosto e estalante feito pedra, vidro ou sei lá o que. Deu-me trabalho cuspi-los ou remove-los da ponta da língua. Que foi esfregada providencialmente e com esmero na gola da camiseta.
Aquelas tranqueiras não iriam fazer muito bem para minha garganta, e muito menos para meu estomago, que se esmeravam em suportar o eterno café, outrora quente, sobre a mesa e visitado por incautos mosquitos, que teimavam em tentar sorve-lo ou transformá-lo em piscina. Tapas, agressões verbais os mantinham longe de serem afogados ou cuspidos contra as paredes ou chão, mas nunca para lixeira. Afinal um arquivo onde sempre encontrei as contas insuportáveis, e arremessadas na fúria do descaso ao meu parco provento.
Transparentes, porém opacas do meio para aquilo que deveria ser o fim, ou inicio por não ter qualquer vestígio de ponta. Porque essa ficava protegida por uma minúscula esfera, que represava os mililitros azuis. Mas livres! Inundava os lábios, bolsos ou a expressão criativa. Mas por vezes lambidas para ajudá-la a liberar seu liquido precioso em dias secos.
Nem Dante descreveria tal sacrilégio. Só existe caos, se organizado. Porque, se não, como existiria? Que importância pode ter o fato de um dia ter sido transparente, octogonal e com duas tampas azuis. Pra mim inúteis! Vai se entender como a lógica organizacional feminina funciona. Discriminar por não atender as normas estéticas. Tão precioso objeto.
Essa coisa toda é um delírio de mea-culpa por eu ter descoberto um dos tais compartilhadores de arquivos. Roubar sem a tarja de ladrão. Esconder em chips a pilhéria. E o pior, partilhar com muitos ou milhões de cúmplices intocáveis. Já vi o fruto. Um vídeo de um show pelo qual só despendi um click no mouse. A minha caneta deve estar se remoendo pelo que me tornei: um racker ou um ladrão moderno, que abre os esconderijos repletos de tesouros sem ter que pronunciar as palavras mágicas abra-te sésamo. Dúvida cruel. O que fazer? Deletar?
DiMiTRi
29/03/09 13:31