18 O SUMIÇO DA PONTE
Estou ainda por saber o que não se rouba com facilidade e ousadia, aqui, nesta face da Terra. Um mirim, ali, na esquina, num abrir e fechar de olho, afana um celular ou relógio do cidadão; acolá, a quadrilha organizada ataca um carro-forte ou sai furando o chão, como o tatu, à procura da caixa-forte; no Planalto, falsos representantes do povo se locupletam e, lá distante, no Oriente Médio, os ianques metem mão no petróleo alheio.
Agora, vejam um inusitado. Risível, se já não for bastante inacreditável. Uma ponte que media trinta metros de comprimento por sete metros de altura, indo da base até a passarela, da noite para o dia levou chá de sumiço, em Fortaleza. A informação é oficial e vem por parte da Secretaria Executiva Regional III, órgão umbilicalmente ligado à Prefeitura.
Essa obra de engenharia semi-artesanal, que ligava dois populosos bairros, fora construída sobre potentes pilares cilíndricos de concreto e a passarela era feita de madeira fornida, toda ladeada por grossas correntes de ferro. Além da total estrutura da ponte – façam bem ideia –, até algumas pesadas pilastras de cimento foram levadas pelos lalaus.
Quisera poder, jamais, veicular acontecido assim, coisa que arranque chiste e gozação da língua das pessoas, em relação à minha aldeiazinha. Mas minha província, como todo este mundão sem tampa, da propriedade de Deus, está cheia de lances hilários e safados.
Primeiro, um boato espalhado: a Defesa Civil, após interditá-la, prometendo a construção de nova ponte, teria anunciado que aquela estrutura de utilidade pública estaria ameaçada. Depois que Inês era morta, ou seja, com a ponte sumida, claro, a DC desmentiu a fofoca espalhada. Ameaçada de queda ou não, ela ainda era traste de serventia. Crianças, diariamente, indo e vindo à escola, pessoas dirigindo-se a seus serviços, transitavam entre Antônio Bezerra e o bairro de Dom Lustosa.
Quisera tanto, demais, jamais pôr no oco do mundo um fato assim, coisa hilariante e ridícula. Agora, por favor, meçam direitinho: esse acontecimento ruim, nefasto, feio, depreciativo e ridículo – levar-se inteirinha uma ponte gigante – tem comparação com o roubo da coisa pública, tanto no Brasil como no mundo todo, perpetrado por “homens públicos”? Dá para comparar com o roubo de petróleo no Iraque, no Afeganistão e no Paquistão? Ãhh, tem comparação, tem? Respondam francamente.
Seja qual seja sua sentença, povo meu, continuo repetindo minha indignação: macacos me engulam! Pelo inusitado, quiçá pelo inédito da coisa acontecida, por aqui, na minha aldeiazinha, digo e dou fé de cartório que levar reeleição, na marra, mudando as regras do jogo eleitoral, e meter mão num tribunal de São Paulo, sendo tarefa para mestres, devem ter sido obras bem mais infinitamente fáceis que afanar uma ponte enorme de trinta metros de tamanho.
Não inventei nada, até aqui. Esta crônica me a deu, de mãozinha beijada, foi a nossa imprensa destes 27 e 28 de março. Foi mesmo. Sem mentira alguma.
Fort., 28/03/2009.