Rascunho de Gente (Felicidade II)

Se tudo pudesse ser feito antes num rascunho, boa parte de nossos problemas seriam resolvidos. Por exemplo, poderia ter sido nascido antes num rascunho... Daria para ver, com a obra rascunhada, o que de bom seria, ou o que de ruim deveria ser refeito. Apagava um risco aqui outro ali e depois passava a limpo. Sairia bem melhor.

Chamo isso de um devaneio no silêncio da noite. Afinal, é assustador ver a ciência criando rascunhos de gente, aparando as arestas, pintando os olhos de verde, esticando a altura, reduzindo a largura. Uma promessa de perfeição.

De tão perfeito, já nasce morto.

A imperfeição é a vida humana em si. Cheia de contradições e confusões. A beleza humana eu diria, está na feiura da alma cansada de sustentar um mínimo que seja de singularidade.

Nas rua vemos as pessoas passadas a limpo. Uma sequência de mesmos... mesma moda, mesma cara mascarada da alegria passada a limpo. Uma felicidade desproporcional à sua tragédia.

O belo está escondido, triste e humano.

Mas, você que está lendo este rascunho, não pense que este humano que nasceu rascunho faz uma exaltação à tristeza. Bem, dizendo assim talvez até faça, mas o que está em jogo aqui é dar espaço à beleza do triste... A ilusão de receitas prontas para uma vida feliz é infinitamente mais triste que viver, com todas as lágrimas, dolorosos momentos de tristeza. A beleza do triste não é estática, mas tem movimento, passa. Cair é ter a chance então de sentir os joelhos ardendo, o gosto da terra e sangue. Mas, é também a imensa e momentânea alegria em curar as feridas e erguer-se da terra viva.

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