17 ANTROPÔNIMOS ESTAPAFÚRDIOS*
Muita gente já o fez, com brilhantismo, em crônicas, artigos, ensaios, textos de humor e outros escritos. Também, hoje, quero meter meu bedelho na mania que certas famílias brasileiras têm de escolher nomes estapafúrdios para pôr nos coitados dos filhos.
Isto mesmo: nomes próprios e estapafúrdios. Vou defini-los, aqui, em parceria com o mestre Aurélio: nomes extravagantes, esquisitos, esdrúxulos, excêntricos, singulares.
Enquadrado no último adjetivo, supra, o camarada ainda está na faixa dos nomes aceitáveis, assim creio. Não incomoda tanto ter no para-brisa um nome singular, desde que dentro do marcos da coisa razoável.
Por exemplo: se o sujeito recebeu no papel de cartório a graça de Epaminondas, Nabucodonosor, Pancrácio ou Pafúncio, ainda vá lá. É apenas um gajo que leva uma graça singular. Este sujeito não está, ainda, na lista dos portadores de nomes estapafúrdios. Digo mais claramente: esdrúxulos, excêntricos. No máximo, ele traz na certidão de nascimento um nome singular.
Mas, paciência, Mister Mom, é demais. Não é humor que faço, não. Uma secretária de escola estadual, no Estado do Ceará, me afirmou, na fila de um banco, que pela sua unidade escolar passara um cristão de Deus com este nome: Mister Mom. Nome, para mim – ou estou sendo severo com a modernidade? –, bastante estapafúrdio.
Veja como os educadores estão avançados em detectar, nas escolas, sobretudo escolas públicas e da periferia, nomes estapafúrdios. Outro dia, mesmo, uma mestra me veio com este, bastante sugestivo e sonoro: uma menina chamada Vlargínia. Não, não é invenção deste cronista. Vero, vero, de verdade.
Militei como professor, anos a fio. Às vezes flagrava a mim mesmo com certa picardia na ponta da língua. Acho, hoje, que até dava azo a que meu chiste parecesse preconceito. Mas não era preconceito, não. Só implicância mesmo. E muitas vezes, em conversas de intervalo, eu me saía com esta: – Pobre inventa nomes bonitos para botar nos filhos.
Se alguém, agora, intuir – depois de tantos fatos – que fui, por vezes, preconceituoso, ao proferir tal heresia, por favor, estou, humildemente, a me penitenciar. Também pecuniária, histórica e sociologicamente, em sendo professor, era igualmente pobre. Só que não me atreveria, jamais, nunca, a pôr um nome estapafúrdio num filho ou numa filha.
Com que cara o meu lídimo rebento – menino ou menina – iria sair, por aí, exibindo na testa o nome de Pauderney, Marcôncio, Anfilófio, Nyckson Ray, Purina, Prikitilda, Medússula, Astelina, Divolar, Alfésio, Eustógio, Protógenes ou Blue Bird (mulher)? E com que cara eu iria dizer para os meus vizinhos e amigos: – Foi escolha por consenso, opção minha e da minha consorte!
Gosto de brasileiro que põe nome descomplicado nos seus herdeiros: Manuel, José, Antônio, Carlos, Luís, João (modéstia à parte), Joaquim, Maria, Francisca, Rita, Glória, Pedro... O guri e a garota que suportam nomes estapafúrdios, ridículos, até, não têm culpa da burrice dos pais. Por isso, sou a favor de que, depois de taludos, arrimados em lei, eles possam ir ao cartório e mudar suas graças estapafúrdias, quero dizer, ridículas.
Duvido que um ianque bote o nome no (a) filho (a) de Asclépio, Protásio, Paterniano, Getro ou Fermelinda. Mas brasileiro, que, em média, não faz bonito como em Portugal, sacode nos ombros do pobre do (a) filho (a) coisicas ridículas e estapafúrdias assim: Johnny's (sic, assim mesmo), Blue Bird, Houseman, Nickson Ray, Rally e Relly (irmãos, coitados!), Karolyne, Lindon Jonson, Dayanne, etc.
Aff, semelhantes meus!... Macacos me mordam. Vou-me embora para Netuno, ou para qualquer outra galáxia menos longe, que "lá sou amigo do rei". Em tempo: os antropônimos estapafúrdios, todos, acima referidos, mesmo aqueles que não soam muito bem, sem invenção alguma, palavra de fé, foram – eu disse todos – colhidos em conversas com pessoas confiáveis ou por mim mesmo anotados.
Fort., 25/03/2009.
(*) Acrescento um rol de nomes incomuns, certamente extraídos da vida real, com base em bibliografia. Eis a lista:
Abc Lopies - Adão Kodak - Adriano Costa Vaso Veludo - Amim Amou Amado - Antônio Carnaval Quaresma - Aricléia Café Chá - Benedito Camurça Aveludado - Brandamente Brasil - Cafiaspirina Cruz - Céu Azul do Céu Poente - Danilo de Cadê Negócio - Delfina Rodeio do Curral - Dezecêncio Feverêncio Delegas - Esparadrapo Clemente de Sá - Francisco Dias Bem-Bom - Graciosa Rodela d'Alho - Janeiro Fevereiro de Março Abril - João da Mesma Data - Joaquim Couve-Flor Malvas - Maria Passa Cantando - Maria-Você-Me-Mata - Nascente Nascido Puro - Oceano Atlântico Linhares - Rolando de Alto a Baixo da Estrada - Sebastião Salgado Doce - Último Vaqueiro - Um Dois Três de Oliveira Quatro - Vicente Pica-Pau Veludo - Vitória Carne e Osso - Zero Fonseca [FONTE: Pandiá & Ana Pându. QUE NOME DAREI AO MEU FILHO? Rio de Janeiro, Ediouro, 1999]