DOCE MONOTONIA
Cinco horas da manhã...
No melhor do sono, o “triiiiiiim” insuportável do despertador em meus ouvidos acorda-me e obriga-me a levantar-me.
Às pressas escovo os dentes, troco-me e tomo um cafezinho preto, pois o ônibus passa em minha parada às seis horas em ponto, e às sete tenho que estar no trabalho.
Abro a geladeira e pego a famosa marmita (por alguns apelidada de FM) preparada na noite anterior e a coloco dentro da mochila. Saio correndo para a parada, que fica a poucos metros da minha casa... Por pouco não perdia o ônibus... se isso acontecesse, o próximo só dali a trinta minutos.
Após uma hora e meia na estrada, chego, enfim, ao trabalho com trinta minutos de atraso, pois, para variar, um prego no asfalto furou o pneu dianteiro esquerdo do ônibus.
Antes que o chefe perceba meu atraso, troco de roupa, pego as ferramentas de trabalho (rodo, vassoura, balde e pano de chão) e começo a labuta. São quatro horas ininterruptas de faxina até o momento mais esperado do dia: a hora do almoço.
Dirijo-me ao refeitório, abro a estufa e retiro o meu FM. Sento-me no único lugar disponível: um velho e empoeirado tamborete esquecido no canto da sala...
O cardápio de hoje é o mesmo de ontem e, provavelmente, o de amanhã: arroz, feijão e ovo frito, mas sou muito grato a Deus por isso, pois, ao contrário de muitos, tenho o que comer.
Depois de um longo e cansativo dia de labor, recolho meus pertences (a mochila e a marmita vazia) e, antes de enfrentar outra árdua tarefa: atravessar as pistas em direção à parada de ônibus, enfrento dez minutos de espera na fila até chegar minha vez de bater o ponto.
Novamente saio correndo - dessa vez com destino à minha casa -, pois se perder o “buzão” das dezoito e trinta, outro só depois de uma hora, e olhe lá!... O trânsito movimentado impede-me de chegar ao outro lado da pista, onde fica a parada.
A cena se repete: o ônibus chega, pára, recolhe os passageiros... e eu, “preso” do outro lado, nada posso fazer a não ser acenar para o motorista que nem me percebe e arranca antes que todos subam. Se tivesse chegado uns trinta segundos antes, não teria perdido a condução. Sou obrigado a esperar por mais de uma hora o próximo GOLF (grande ônibus lotado e fedido).
O tempo vai passando, o povo vem chegando, a impaciência apossando-se de algumas pessoas, inclusive de mim... A essa altura, a parada está superlotada, mas não tanto quanto o ônibus que acabara de chegar. Um tumulto generalizado forma-se na porta do veículo... Ufa!... que sufoco!.. Empurra daqui, espreme-se dali e finalmente consigo entrar, ou melhor, colocam-me lá dentro.
O interior do velho Mercedes estava tão lotado que mal dava para se coçar. Caso sentisse uma coceira no tornozelo e fosse preciso levantar o pé para coçá-lo, nessa posição ficaria até que outro pé se levantasse com o mesmo objetivo.
Enfim, o lar-doce-lar...
Exausto, retiro da mochila a marmita e coloco-a na pia para que seja levada e reabastecida para o dia seguinte. Apanho a toalha e sigo para o banheiro a fim de um delicioso banho, mas, como sempre, não tem água no chuveiro. Quando isso acontece, geralmente só retorna após a meia noite. Resolvo, então, jantar enquanto assisto aos programas sem cultura que a TV me oferece.
O cansaço é grande, o sono chega, mas a falta do banho não me deixa dormir. Horas depois, após alguns cochilos no velho sofá, a água chega ao chuveiro e finalmente consigo banhar-me. Já passa da meia noite e meia. Deito-me e logo adormeço.
Cinco horas da manhã... o “triiiiiiim” insuportável do despertador em meus ouvidos acorda-me...