Minhas vidas,muitas estações
Meus verões sempre foram intensos,como os temporais que eu amava!
Sonhava com fadas e em voar com as pipas que coloriam o céu,
segurando no barbante!Feliz eu ficava em acordar muito suada,bem mais cedo que de costume nas férias,para aproveitar as manhãs tão quentes.Era minha infância!Brincar era prazer absoluto,catecismo que não enjoava,nem machucava joelhos!
Foi só um dia,mas o mar quase me levou duas vezes,tentando engolir minha adolescência.Na hora só pensei no xingão que levaria da minha mãe se morresse!Em vez de medo,adquiri respeito pelo mar,e a certeza que o sol era meu melhor amigo,bem como a areia dançarina dos ventos que criava tatuagens serpenteantes,nas pernas e braços salgados,molhados.(Sempre teve vento na praia!)
Na adolescência passei a primavera.Sonhava acordada!
Amei cada flor que eu descobri,cada grama verde que eu vi,cada vôo de pássaro que acompanhei,cada cheiro de vida que captei no ar!Senti muito a falta da terra,do cheiro da chuva nas árvores frutíferas,
de morar próxima do primeiro amor,quando mudamos de casa para um apartamento.
Chorei e entrei fundo no outono!As folhas amarelaram,junto com meus sonhos de passar de cara na faculdade,após o segundo grau.
Fiz vestibular de novo e também muitos amigos.Amei aos pedaços,
vacilei nas escolhas,descobri sexo,prazer,pizzarias,cigarros,martini bianco e a música nacional!
Numa manhã de muito frio,protestei na frente da reitoria,unindo minha voz que cantava Geraldo Vandré e Mercedes Sosa com a turma nos bares da vida,às vozes que pediam melhores salários para professores,
eleições diretas para presidente e almoço no RU à menos de R$0,20!Os ouvintes eram militares,com ouvidos de repressão.Corações de chumbo.Regime de obediência,era militar.
As flores venceram os canhões e meu inverno teve gosto de "founde"
e vinho tinto!Ouvindo Chico Buarque,não joguei "pedra na Geni",
mas "apesar de você",votei para presidente!Era Tancredo!Era esperança!Virou só promessa e pó,com o "coração de estudante" de Milton Nascimento,de fundo musical...
Quantas estações já foram?Não sei...conto apenas a volta que dou ao redor do sol todos os anos,num único dia!Sei que outras estações vieram,trouxeram frutos,meu fruto herdado!O suor do meu trabalho molhou a minha trajetória,resisti nas intempéries e insisti na monocultura das reponsabilidades que o amor traz,mesmo com as mãos amassando espinhos,pois eu sabia que haveriam rosas!
Minhas estações continuam passando,e como uma lagarta ou cigarra,sinto que passei com elas!Mas é um passar suave agora.
Já canto como a cigarra,só por prazer e já voei mais alto que qualquer borboleta,conhecendo o mundo!
O calor do verão e o frio do inverno não tem a mesma importância.
Meus temporais eu agora crio,(preciso do oxigênio que se renova nas tormentas) e entro no mar de peito aberto,pois já sei nadar!Sinto mais emoção no outono,quando uma folha caindo ainda lembra minhas perdas mais recentes...As flores da primavera ainda vou colher muitas mais,pois sei,depois de semear esperanças,agora onde elas nascem:pertinho do coração!