## falar é fácil ##
Não foram poucas as vezes em que ouvi, indignada, que brasileiro não trabalha, que é preguiçoso, que não tem nada porque não rala. Engraçado, mas essas observações só saem de bocas bem abastadas e que não sabem, vale ressaltar, "da missa um terço" o que é ralar para viver.
Claro que excluo da minha observação os que realmente são preguiçosos, não tô defendendo a preguiça nem a falta de interesse pelo desenvolvimento pessoal de ninguém. Apenas observo (e não é pouco), o sacrifíco da maioria dos brasileiros que para conseguirem o mínimo de dignidade para família, fazem das tripas coração.
Trabalhei muitos anos numa empresa e gostava de estar em contato com todos, conversar, abrir meus ouvidos aos que não são escutados. Confesso, cansava-me só o fato de ouvir-lhes. Mulheres que acordavam às 3:30h da manhã para fazer almoço para a família, deixar as crianças com uma vizinha, que pela mesma situação, recebia um pagamento ínfimo pelos préstimos, se arrumar, esperar um ônibus na parada lotada e enfrentar mais dois transportes para chegar ao trabalho, diga-se de passagem, disposta e sorridente, sob o risco de perder o emprego, bastando para isso que o patrão percebesse seu desânimo. Após um dia de muito trabalho, voltar a pegar 3 ônibus, buscar os filhos, fazer jantar, lavar e passar roupas, arrumar a casa e dormir uma hora da manhã para no outro dia estar de pé às 3:30h.
Hora extra? A empresa não pagava hora extra. Você batia o ponto e voltava a trabalhar. Que fosse depois receber na justiça, como diziam. Em algumas épocas do ano, liberavam, cientes do massacre pelos quais os funcionários passavam. Engraçado é que os níveis mais altos recebiam gratificações nessas ocasiões enquanto que os mais baixos apenas as horas. Uma simples questão de maior responsabilidade (????).
É fácil para quem nasceu em berço de ouro, ou quase isso, falar que brasileiro é preguiçoso. É fácil para os que recebem "horas extras" nas férias, dizer que estão mal porque não fazem por onde merecer. Isso me lembra uma frase que li um dia desses atrás de um caminhão: "falar de mim é fácil, difícil é ser eu!"
Sabe, o que é difícil engolir são esses aristocratas zombando da nossa credulidade, ignorando a situação do país e ainda por cima lutando apenas pelos próprios aumentos salariais e interesses, num descaso que chega a ser desumano. Não há interesse em diminuir essa desigualdade social absurda e sim aumentar cada vez mais o abismo que se forma entre os que possuem tanto e os que sofrem para ter o mínimo, que não é quase nada.
Brasileiros "ralam" sim, precisamos é tapar aos poucos os abismos que os tornam cada vez mais distantes dos olhos dos narcizistas sociais.