TRINTA SEGUNDOS
Em nossas vidas, fatos inusitados acontecem, os quais, na maioria das vezes, provocam-nos situações de embaraço. Algum tempo atrás, um desses aconteceu comigo:
Em uma repartição pública, eu pacientemente esperava o elevador no andar térreo, pois precisava ir a uma seção que ficava no quarto andar. Depois de alguns minutos de espera, finalmente o elevador chegou, abriu a porta e eu entrei. Em seu interior não havia ninguém, apenas eu, que acabava de entrar, e um mau-cheiro insuportável de “gases tóxicos” – ou, se me permitir o leitor, um peido – que ali fora deixado preso por alguém que desconhece os problemas da camada de ozônio e que certamente necessita de cuidados médicos, pois, literalmente, está podre.
Tentei sair dali o mais rápido possível, porém a porta do elevador fechou-se antes que eu pudesse retornar. Mais nada pude fazer, a não ser prender a respiração e assim ficar até o meu destino final, torcendo para que o pior não acontecesse.
Aconteceu!... Repentinamente o elevador pára no segundo andar, abre a porta e a seguir entra um senhor engravatado, carregando na mão direita uma valise preta, daquelas que só os executivos transportam. Ao entrar, o moço fino, elegante, perfumado e de aparência séria, foi recepcionado por aquela ventosidade mau-cheirosa que buscava encontrar ao menos uma fresta para poder sair dali e circular mais à vontade pelos corredores, até esvair-se. Com elegância, o moço tentou retornar, mas antes que pudesse fazer qualquer movimento, a porta fechou-se. Disfarçadamente cruzou os braços na tentativa de tapar as narinas enquanto olhava-me com olhar fulminante.
Entreolhávamos desconfiados, eu sentindo queimarem-me as faces de tanta vergonha, sem ao menos poder defender-me da acusação que os olhos daquele moço lançavam-me, pois, como costumam dizer por aí, “a emenda ficaria pior que o soneto”; ele, como se estivesse querendo mandar-me procurar um líder espiritual para cuidar da minha alma - ou quem sabe encomendá-la? -, pois, tomando por base a fedentina que circulava entre aquelas quatro paredes, o corpo já deveria estar podre, quase a se decompor, em putrefação...
E assim ficamos - eu torcendo para chegar logo ao meu destino e ele, olhando-me de soslaio, pensando só Deus sabe o quê sobre mim- por quase trinta segundos, que para ambos parecia uma eternidade.