BOM SENSO

Certo dia estava eu na fila de um caixa fácil de uma agência bancária. Neste dia o movimento era razoavelmente tranqüilo. Em cada fila não havia mais que 4 ou 5 pessoas. De repente entra uma senhora sexagenária, que aparentemente parecia gozar de boa saúde, confirmada até pelo seu sapato alto que não intimidava seus passos rápidos e boa postura.

Passou rapidamente pela fila e posicionou-se diante do "chashier" mal dando tempo para o cliente que estava fazendo a transação recolher seu dinheiro. Não sei se alguém chiou baixinho, ou se ela mesma se tocou que estava sendo deselegante pela forma com que prepotente cheia de direitos, passou na frente de todos. Para completar, fez um discurso querendo dar satisfação aos olhares críticos e tentando explicar que não estava furando a fila. Estava resguardada pelo Estatuto do Idoso e que a Resolução 2.878, de 26/07/2001, 2.892, de 27/09/2001, e a Circular 3.058, de 05/09/2001, disponíveis no site da Febraban – Federação Brasileira de Bancos garantia aos idosos atendimento preferencial. Ninguém ousou dizer uma palavra.

Na fila estava uma jovem senhora de 28 anos que precisava chegar em casa cedo para fazer o almoço. Atrás dela, um rapaz de seus 26 anos que tinha deixado seu avô sozinho no hospital enquanto vinha ligeiramente ao Banco. A senhora sexagenária berrava que tinha compromisso no salão de beleza e depois precisa ir ao shopping. Ganhou com tudo isso a antipatia de todos.

Outro dia, na fila do correio, que também neste dia estava razoavelmente pequena, encontrei-me com um senhor octogenário que parecia não conhecer os direitos que a lei lhe resguarda. Havia umas três pessoas em sua frente e ele aguardava sereno a sua vez. Indaguei porque ele não se dirigia logo ao guichê. Ele disse que naquela manhã ele não tinha pressa, estava se sentido muito bem de saúde, como a fila estava pequena suas pernas não reclamavam de ficar em pé, e apontou para as pessoas que lhe antecediam dizendo que talvez elas tivessem mais necessitada de ganhar tempo do que ele. Ganhou a simpatia de todos com a sua fala.

Não tendo condição de refletir sozinho sobre estas duas situações, tive a coragem de tentar dialogar sobre este assunto com um grupo de amigos. A maioria optou pelo discurso que direito é direito, se estou dentro da lei, porque abrir mão para fulano ou sicrano ou pior ainda, para quem nem se conheço? Quando eles tiverem seus 60 anos terão também tal regalia.

Alguém tentando amenizar meu desencanto com as respostas que não queria escutar, explicou que tudo depende de “bom senso”. A lei foi feita na intenção de minimizar o sacrifício das pessoas que após os 60 anos não gozam de saúde, para enfrentar uma fila, não têm condição de ficarem em pé por um espaço considerável de tempo ou outras situações desta natureza.

Compreendo muito bem, que as aparências enganam. Às vezes, uma pessoa que transmite jovialidade pode estar menos saudável do que uma pessoa de idade mais avançada. Mas este não é o caso em questão. Refiro-me aqui a incoerência de quem está vendendo saúde tirar partido de uma lei que lhe beneficia e doa quem doer.

Bom senso é bom e eu gosto.

Maria Dilma Ponte de Brito
Enviado por Maria Dilma Ponte de Brito em 08/03/2009
Reeditado em 09/05/2020
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