Transparência e voo
- “lembrai do amor, sem tanto desencantio!” – como diria Rubem, aposentado da Viação Férrea, olhando novela, espanando insistentes moscas na cozinha branca e amarela. Depois mirava medindo comportamento dizendo: menino abre o olho! Era aquele rosto sorridente sempre preso ao cigarro dependurado no canto da boca. O menino sumia para dentro da saia polonesa da forte avó Deczuta. Era tímido, carregando um forte apache para os cantos escuros da casa.
Talvez fosse à hora de revisar o futuro desse menino composto de silêncio e escola franciscana. Será hortelão. Enquanto hortelão será tratado como bagual de acordo com a hierarquia das novelas. Comerá o pão que o diabo amassou roubando flores dos beijos até o sino celebrar um pacto único. Trocará a filosofia pela escravidão de uma princesa. Tão perdido hortelão de um grande e único amor. Sem ações, nem debêntures, nem ruas movimentadas. Aquelas bocas imundas falavam de todos e de tudo com escárnio. Vejam este rosto bonitinho de cera. Tremendo! Era possível ouvir dúvidas e risos.
-Usará brincos, saia no joelho, sandálias de tiras finas...
-Será uma boneca. Gargalhadas. Ruídos de talheres. Diovana fazendo previsões sobre o menino: infenso ao risco pastoral das paixões lavradas pelo luar nos recantos de quintal e cerca. Estava certa. Buscava alimento no amanhã incerto do afeto. Preferia ser hortelão em terras tão imensas, varão forte. Homem e menino sob os efeitos das especulações, que eram sensíveis e não lhe abalavam. Tanto mais produzia o efeito de comédia muda, efeito ainda maior de curiosidade sobre o que dizem naquelas orelhas imensas, porém ocultas no todo da discrição dos sonhos de transparência e vôo.
Sumiu durante anos e ressurgiu um belo dia na porta com seu livro, com sua lira, retornando aos predicados da casa e da ortografia. Rústico, sempre rústico. Cuidando do verde espraiado para que a parte noturna pudesse receber foros de constelação adequada à sabedoria sobre os erros e enganos. Tem-se a ausência mínima no recorte que poderia ter sido lembrança no tempo das fotografias, mas não.