ALQUIMIA

Existem algumas coisas que são como um fio de cabelo na comida. Um furo na meia. chuva na praia. Pneu furado... Só atrapalham e cortam o tesão.

Tem coisa mais inconveniente, do que entrar numa loja e ter os seus passos seguidos milimetricamente por um atendente? O sujeito na dá um vão sequer, para você viajar nos produtos, imaginar, criar, fazer uma composição, saborear com os olhos, acarinhar com as mãos. Se apaixonar antes de comprar. Você anda, ele anda. Você pára, ele pára. Se você virar para ele, ele lhe engole com aquele olhar de: “Vai levar ou não?” Invariavelmente eu vou embora e não levo.

E quando você tem que topar com aquele sujeito de mal com a vida? Geralmente ele nem sequer lhe dirige o olhar. Então você diz: “Bom dia!” E ele resmunga algo que você supõe que seja a resposta ao seu cumprimento. Comumente tento adivinhar o que aconteceu com o cara: “Será que ganha pouco? Brigou com a mulher ou quem sabe com a sogra? Tá com dor de barriga ou de dente? Quebrou o carro a caminho do trabalho?” Saio sem saber a resposta, mas com a certeza de que, tão cedo o mal humorado não vai ter o desprazer de me atender.

Como toda a moeda possui duas faces, tem também o excessivamente de bem com a vida. O cara é simpaticíssimo! Você nem bem entra e ele grita: -“BOM DIA! “Antes que você tenha tempo de responder, ele já emenda uma piadinha daquelas que acabou de ler num folhetim e que você educadamente acha graça e pensa que acabou por ali. Mas que nada! Surgem outros causos, geralmente extraídos de clientes que passaram por ali, os quais ele faz questão de conhecer profundamente em suas particularidades. Para me safar, geralmente passo a mão na primeira coisa barata que vejo na frente e fujo, antes de virar mais um causo.

Não poderia esquecer os teleconsultores. Os menos palpáveis, mas sem sombra de dúvida, os mais temíveis. E que belas falas decoradas possuem! Ininterruptas, diga-se de passagem. Quando você pensa que vai conseguir, agradecer e dispensar tão cordial atendimento, ele interpela com um novo discurso. E vai falando, e vai falando...Coisas que você nem sequer ouve, porque está pensando na próxima e infalível estratégia que vai utilizar, para poder descansar o fone e os ouvidos. No meu caso, quando digo “alô” e uma voz macia pergunta se a senhora Tal (que sou eu) está. Respondo sem direito à réplica: “A patroa tá viajando.”

As energias estão no ar e são responsáveis pela atração ou repulsão dos acontecimentos. Não é à toa que existem lugares que adoramos entrar e sermos clientes e outros que, apesar do belo apelo visual não nos sentimos atraídos. Assim é a química dos negócios, assim é a alquimia das paixões. O equilibro, o bom senso, a sutileza com uma certa dose de criatividade e ousadia, são capazes de transformar um simples negócio em uma mina de ouro ou uma mera conversa numa grande paixão.

Léia Batista
Enviado por Léia Batista em 06/03/2009
Reeditado em 06/03/2009
Código do texto: T1473111