O Tempo
Queria eu poder tocar o tempo. Trazê-lo pra perto, pra bem perto, e então batermos um papo. Desses que você já imaginou com Deus, numa mesinha de bar, talvez bebendo vinho ou um simples "suco-natureba". Só que Deus é Deus né, e como o tal do tempo é criatura Dele, suponho que fosse mais fácil agendar um papinho com a mesma do que com a “Chefia”. Mas não, não é. O tempo é ágil, é sagaz. É quase furtivo. Ele se esvai, sem receio do futuro ou do que vai deixar pra trás. O tempo não tem medo de correr. Mas eu tenho.
E enquanto ele dá seus passos contínuos e simétricos à procura de um tal ancião infinito, eu sinto que posso encontrá-lo. Sinto que sua essência paira ao meu lado. E que posso falar, cochichar no seu ouvido por um segundo. Dizer “Ei, por que você corre tamanha maratona sozinho, se eu estou aqui, estagnado, me sentindo estagnado. Por que não me leva junto com você? E então terás companhia e eu terei o dom de ver tudo passar como um filme, numa seqüência. Sem que você corra e eu sinta que estou perdido, que estou girando em círculos, que perdi o fio à meada”. Uhum, talvez pareça mais barganha.
No fundo, o tempo é tão velho quanto o infinito, então, talvez não me ouça muito bem. Apenas banca o atleta todo santo dia. Ou não. Há um aperto que sinto no coração ultimamente e que, às vezes, também dói na alma. É uma mistura de ansiedade positiva com uma angústia, já não tão positiva. É dualístico, quase um carma. O que está parado parece uma desordem e a desordem parece flutuar como no espaço, dentro de uma nave. De um lado, olho pela janela e vejo um “buraco negro” tomado pela loucura, desespero e histeria de pessoas aos gritos e prantos.
Do outro, porém, eu vejo brilho. Tão notável quanto o de uma ou mais estrelas. E o clima infernal que perturba a mente por um segundo – daqueles em que o tempo ironicamente se atreve a parar – é apaziguado, doutrinado. A consciência se acalma, o ser retorna. Aquela história de que “sempre há uma luz no fim do túnel” pode ser verdade. Não sei se a luz é onipresente, mas a visão mexe com todos os nossos sentidos. Só o fato de enxergá-la e dessa forma sentir que ainda há vida correndo pelas veias significa muita coisa. Significa esperança.
Mas sei por que o tempo não pode esperar. Faz parte de sua função, vital pra humanidade. Pra mim, pra você, pra incontáveis pessoas. É o único que pode sentir o som de nosso coração, por completo, e apagar aquela dor, a dor que todos nós sentimos, profundamente. Então, ele precisa rodar milhões e milhões de quilômetros todos os dias pra não decepcionar ninguém. Pra que nenhuma voz ecoe duvidando que ele exista, ou principalmente sofra sem vê-lo passar. Sem sentir aquela doce brisa de alguém voando de rasante. Aí se põe a correr. E faz parte de sua mágica apagar correndo, deixando rastros agradáveis de presente: as lembranças.
Estava enganado, o tempo não é um atleta. É um artista divino! Mas ainda me perco consideravelmente em seus passos. E creio que até o fim dos tempos.