CRÔNICAS DE GRAÇA: Os Trens
Como sinto saudade às vezes. Saudade de um tempo quando tudo parecia mais fácil e inocente, todas as coisas pareciam mesmo ter uma cor mais viva e vibrante e até um cheiro mais doce.
E é mesmo por causa do cheiro que escrevo estas palavras tão saudosistas. Acontece que entre todos os odores existentes no mundo, o que mais me toca o coração é aquele cheiro de borracha queimada misturado com ferro e fogo, que emanava abundantemente dos trens de antigamente quando paravam nas estações.
Os trens de antigamente. Estranho pensar assim, já que este antigamente passou há não mais de dez anos... Mas voltemos aos trens.
Que sensação tão perfeita era ficar bem na ponta da plataforma, com os olhos no imenso relógio na parede e procurar no horizonte sinais do trem que chegaria a qualquer momento. Como era lindo quando primeiro se ouvia os apitos, bem longe, avisando que a composição estava a caminho.
E quando ele chegava, aquele titã feito de aço passando inexorável pela plataforma, e a gente ficava contando as portas, tentando adivinhar qual pararia mais perto para a gente subir.
Mas o melhor de tudo eram os corredores. Quando o trem já estava em movimento e a gente escapulia dos bancos e saía correndo, olhando a paisagem que ia ficando para trás cada vez mais rápido. Como eram lindas as paisagens daquela época!
O maior dos desafios, dentro de um trem, era passar de um vagão para o outro. É claro que tudo era muito bem protegido, mas a sensação de pisar sobre aquela tampa de ferro coberta por algum tipo de lona era de intenso perigo e a adrenalina corria dentro de nossos corpos juvenis e curiosos.
Mas a melhor parte, a mais esperada da viagem, era quando aquele pequeno carrinho começava a passar pelos corredores entre as fileiras de bancos. Então atazanávamos nossos pais para comprar uma infinidade de refrigerantes, balas, chocolates... E nem imaginávamos como eram caros nossos caprichos, naquela época.
Como sinto saudade às vezes daquele tempo.