Dona Doida
“Mulher é desdobrável. Eu sou.”
Adélia Prado
Nesta semana de comemorações alusivas ao dia internacional da mulher, minha caixa de email fica cheia de homenagens.Muitos enviam e reenviam mensagens de todos os tipos: religiosas, amorosas, bem humoradas, de autoajuda, meaculpas, encorajadoras. Louvo a iniciativa, mas me pergunto por que essas mensagens precisam ter dia e hora para chegar em nossas vidas. Por que precisamos de datas para nos lembrar quem somos? E por que quase todas nos cobram perfeição?
Sou mulher em tempo integral, todos os dias do ano.Tenho, como qualquer uma, defeitos, problemas, TPM e, vá lá, alguma virtude, claro. Normal demais, comum demais e, considerando que somos maioria, mais uma a figurar nas estatísticas das mulheres de jornada dupla.Trabalho, cuido da casa e da família e, no tempo que me sobra, procuro fazer algo que torne todos os momentos de minha vida especial: penso e cuido de mim.
Tenho parceiros de caminhada muito especiais. Família, companheiro, filho, colegas de trabalho, amigos queridos e especiais. Busco a felicidade... A minha e dos meus. Luto por ela. O que mais uma mulher pode desejar?
Aí é que está: eu continuo desejando, querendo e muito. Mais horas pro meu dia, mais tempo para me dedicar as pessoas que amo, mais calma para administrar o presente e o futuro, aprender mais, ser mais, viver intensamente tudo que a vida puder me dar.
Doida, eu? Sempre. Uma boa dose de insanidade me faz manter o pé na terra, o nariz empinado, a disposição para esperar o amanhã, seja ele qual for. Portanto, quero homenagear a mulher que não desiste, que meio santa e meio louca se mantêm disposta a lutar por uma vida de verdade.E, para ratificar tudo que disse, transcrevo aqui parte de um texto fantástico. Penso que todas nós, as inquietas, as que brigam pela vida, se vêem aqui. E chega de cobrança!
“Toda mulher é doida. Impossível não ser. A gente nasce com um dispositivo interno que nos informa desde cedo que, sem o amor, a vida não vale a pena ser vivida, e dá-lhe usar nosso poder de sedução para encontrar “the big one”, aquele que será inteligente, másculo, se importará com nossos sentimentos e não nos deixará na mão jamais. Uma tarefa que dá pra ocupar uma vida, não é mesmo? Mas além disso temos que ser independentes, bonitas, ter filhos e fingir, às vezes, que somos santas, ajuizadas, responsáveis, e que nunca, mas nunca, pensaremos em jogar tudo pro alto e embarcar num navio pirata comandado pelo Johnny Depp, ou então virar uma cafetina, sei lá, diga ai uma fantasia secreta, sua imaginação deve ser melhor que a minha.
Eu só conheço mulher louca. Pense em qualquer uma que você conhece e diga se ela não tem ao menos três destas qualificações: exagerada, dramática, verborrágica, maníaca, fantasiosa, apaixonada, delirante. Pois então. Também é louca. E fascinante.
Todas as mulheres estão dispostas a abrir a janela, não importa a idade que tenham. Nossa insanidade tem nome: chama-se Vontade de Viver até a Última Gota. Só as cansadas é que se recusam a levantar da cadeira pra ver quem está chamando lá fora. E santa, fica combinado, não existe. Uma mulher que só reze, que tenha desistido dos prazeres da inquietude, que não deseje mais nada? Você vai concordar comigo: só sendo louca de pedra.”
Martha Medeiros - Doidas e Santas