Efeitos Colaterais

Sou gordinha, como todos sabem. Mas o defeito não é de nascença. Vim ao mundo antes da hora, com peso abaixo do normal. Foi na adolescência que o problema se apresentou. De repente ultrapassei os limites e a via sacra começou.

Levaram-me ao médico e ele receitou umas pílulas. Os comprimidos eram bonitinhos, tinham forma aproximada de um coração. Tiravam realmente o apetite. E o sono também.

À noite, em vez de relaxar e dormir, minha cabeça fervilhava. Se fosse em véspera de prova, repassava mentalmente a matéria e seria capaz de tirar dez se a fizesse naquele momento. Se não tivesse nenhuma preocupação, inventava assuntos em que pensar. Sentia-me apta a dirigir um carro, a conduzir um bonde, a preparar o mais complicado dos pratos.

No dia seguinte, porém, nada daquilo era mais possível. Na hora da prova, não me lembrava direito dos detalhes importantes. Se pegasse um carro, atropelaria quinhentas pessoas. E o bonde, então, nem pensar naquela esquisitice.

Comia pouco, dormia pouco, logicamente emagreci. Mas logo meus pais perceberam que os “efeitos colaterais” do milagroso remedinho não eram lá muito saudáveis. Melhor parar com ele e fechar a boca.

E aí eu sonhava com montanhas de brigadeiros e enormes barras de chocolate...