Imagem: Jupiter e Thetis - Jean Auguste Dominique
Música: Die Mozart

O Mistério da vida e a certeza da Morte
 
Há poucos meses atrás um paciente de mais de 80 anos e portador de um câncer assim se lastimou:

- Como é triste a vida, trabalhar, lutar incansavelmente, constituir uma família, construir uma independência financeira e depois ser condenado à morte pela fatal doença.

E eu lhe perguntei:

- Triste é a vida ou a morte? – Ele, suspirando profundamente, respondeu:

- Triste é saber que a vida acaba com a morte.

A vida é o maior de todos os mistérios e a morte é a maior de todas as certezas. Todos os seres vivos nascem, crescem, desenvolvem e depois morrem, com o ser humano não é diferente. A única diferença é que os humanos têm consciência dos fatos, e por ter consciência, sofre.

Tentando entender a complicada situação, lembrei-me do filósofo pré Socrático Parmênides que assim se referiu à vida: “As mudanças são meras ilusões, tudo continua”. Décadas depois, outro pré Socrático chamado Heráclito, referiu dessa maneira: “tudo muda, exceto a mudança”. Esses filósofos com seus intrincados conceitos somente servem para confundir a cabeça dos pobres viventes.

Algumas décadas depois, surgiu na Grécia outro filósofo, um pós Socrático, Aristóteles, que assim foi inquirido por um de seus discípulos:

- Mestre, tudo muda ou tudo continua?

Aristóteles deu alguns passos, olhou para dentro de si, parou suavemente de caminhar, voltou para o seu discípulo e respondeu:

- Tudo muda e tudo continua.

O discípulo meneou a cabeça como quem não entendeu nada e pensou: “o mestre pirou”. Engoliu seco, e um tanto quanto desapontado exclamou:

- Mas como mestre! – E Aristóteles serenamente respondeu:

- A matéria e a as coisas mudam, passam; mas, os princípios continuam.

Meses depois, o mesmo paciente retornou ao consultório, já cansado de tentar uma solução para o seu insolúvel caso, lamentou:

- Doutor, eu me conscientizei que cumpri todas as etapas, a vida dessa maneira não vale mais apena. Já procurei todos os recursos da medicina, que apesar de avançada, é incapaz de deter a morte.

A doença e a certeza da morte, muitas vezes, inibem a arrogância humana e são instrumentos importantes para o ser humano se despojar dos seus bens, da família e da sua própria vida. A doença ajuda o homem, embora tarde, a rever os seus valores e a criar uma nova consciência da vida.

Quanto mais apegado à vida e aos seus valores materiais, mais difícil é encarar a morte; pelo contrário, quando os valores são princípios, o medo da morte é menor. Com a morte os valores materiais passam e mudam de dono o mesmo não acontecem com os princípios, com as idéias e com a arte que continuam como patrimônio do falecido.

Parmênides, Heráclito e Aristóteles viveram há mais de 2500 anos atrás, mas, as sua idéias, os seus princípios continuam vivos e a eles recorremos quando necessitamos explicar alguma coisa.

A morte física não é um mistério, ela é uma certeza, infalível e comum a todos. O maior de todos os mistérios é a vida humana, somente temos certeza do agora, o futuro é uma incógnita e o passado imutável. A morte é comum a todos, a vida é um exercício individual, onde cada um escolhe os seus valores para passar ou para continuar.

Roberto Pelegrino
Enviado por Roberto Pelegrino em 04/03/2009
Reeditado em 04/03/2009
Código do texto: T1469024