O INVERNO VOLTOU À NOVA INGLATERRA
Há dois ou três dias já andava um Robin a saltitar lá atrás no quintal. E o Robin, nesta altura do ano, tem apenas uma missão: anunciar a chegada da Primavera.  Bom, desta vez, o Robin enganou-se... e enganou-me. O Inverno voltou.

Não durou muito o nevão, umas 24 horas de neve que deixou este sudário frio, triste, imenso...

Boris Paternak deixou em O DOUTOR JIVAGO uma cena enternecedora. Iuri, ainda criança, acorda no meio da noite e, atraído por uma luminosidade sobrenatural que entrava pela janela da cela onde passava a noite, levanta-se, vai à janela e espreita para o exterior... Era o nevão que cobria implacável o quintal do mosteiro, e o cemitério onde a mãe tinha sido sepultada no dia anterior.  A criança fica aterrada, sentia medo à ideia de que as couves do mosteiro iam ficar sepultadas e que não poderiam desenterrar-se, ou a imaginar que sua mãe, lá em baixo no coval sob a neve, impotente para resistir à força que cada vez mais a distanciava dele, mergulhava na terra mais profundamente.

Os nevões têm o condão de me recordar cenas deste grande romance que eu li pela primeira vez há muitos anos, e a que tenho voltado muitas vezes. Neste livro, há várias cenas de neve. Em Varykino, onde muitos anos mais tarde, Iuri se refugia com a enfermeira Antipova, há outra também muito chocante, quando eles se despendem definitivamente... Mas esta cena talvez seja do filme que depois se fez, e não do livro.

Bom, de qualquer forma o Inverno voltou à Nova Inglaterra, e já que voltou... e que o Robin anunciador da Primavera desapareceu e ainda não voltou, voltemos nós  à leitura de O DOUTOR JIVAGO ou, pelo menos, à recordação de alguns dos seus textos mais pitorescos.